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100 anos da morte da ópera

2024 marca 100 anos da morte de Giacomo Puccini, a morte da ópera!

*Alexsandro Alves

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Cena de Turandot, ópera de Puccini.

 

Cada geração vive a sua morte da ópera. Desde que nasceu, na Florença renascentista, em 1594, com a Dafne, de Jacopo Peri, o gênero passou e passa por sucessivos enterros para retornar mais viva do que antes. O primeiro enterro da ópera deu-se no Barroco, período em que ela alcançou, pela primeira vez, seu ponto culminante: tornara-se uma febre popular, a ponto de que teatro na Itália era teatro de ópera, temporadas se multiplicavam e teatros de ópera eram construídos de maneira vertiginosamente rápida, para aplacar o delírio por mais produções a cada carnaval. A ópera deixara a vida da corte, para procriar entre o povo.

Depois, a Igreja amaldiçoou o gênero. Proibindo a sua execução nos período de festas religiosas, como a Páscoa e o Natal. A ópera foi banida para o Inferno. Aí, Johann Sebastian Bach, que nunca escreveu óperas, trouxe todas as características do gênero para o oratório. Ao invés de adúlteras se entregando para seus amantes, a expressividade de uma coloratura foi colocada na Alma Cristã, uma personagem que se entregava para o “meu Cristo”, com toda a paixão digna de uma diva operística; além disso, muitas vezes sua música encobria o significado da palavra, dissolvendo-a nos acordes. Händel compõe Messiah utilizando árias de suas óperas anteriores. Assim, os mestres burlaram as imposições eclesiásticas e a ópera foi retirada do Inferno.

Se Wagner não matou a ópera como disse que faria, impôs à Itália uma reavaliação e uma reformulação do gênero sem precedentes naquele país, na tentativa, em vão, de barrar a influência do titã alemão.

Chegamos em Puccini. Giacomo Puccini morreu em 29 de novembro de 1924. Ele herdou toda a tradição operística de seu país em um momento em que essa tradição era intimidada e questionada pelo drama musical. Sua música tornou-se uma síntese dessas duas correntes.

Inicialmente, Puccini foi mal compreendido, diziam que era um compositor fácil, um melodista que negava os avanços harmônicos oriundos da Alemanha. Essa crítica foi possível porque Puccini sabia fazer sucesso. E se tem uma coisa que a modernidade herdou do Romantismo, é que o gênio é incompreendido e, portanto, alheio ao sucesso popular. Mas Puccini sempre foi popular. Gustav Mahler e Richard Strauss se escandalizavam com o volume de aplausos que as óperas do italiano conseguiam a cada récita.

Hoje, a música de Puccini foi integralmente reavaliada: nela estão presentes a tradição italiana, a harmonia wagneriana e, o melhor de tudo, tons impressionistas carregados de legítimas sonoridades orientais, como em Madame Butterfly ou em sua última ópera, Turandot. O orientalismo de Puccini também foi revisto: ele é legítimo e se mescla perfeitamente com seus modos italianos.

Ele morreu sem concluir Turandot. Na estreia, Arturo Toscanini parou a orquestra exatamente no momento em que o coração de Puccini parara e disse, virando-se para a plateia: “Nesse ponto, o mestre deixou cair a pena”. Seu último momento composto foi a ária Nessun dorma, “Ninguém durma”.  Turandot foi concluída por Franco Alfano, mas sempre houve e há, quem torça o nariz para os dez minutos finais da ópera, após Nessun dorma. Em 2001, o compositor italiano Luciano Berio compôs um novo final.

E desde a morte de Puccini se fala em uma nova morte da ópera. Uma morte que agrega as obras de Richard Strauss, que viveu até 1949; a obra-prima de Berg, Lulu, estrearia em 1979 e faz parte do repertório tradicional; Messiaen estreia Saint François d’Assise em 1983, John Adams e Philip Glass ampliam o repertório em quase uma dezena de novas óperas em linguagem minimalista. E Marlos Nobre, em Recife, anda às voltas com uma ópera sobre o cangaço, ainda sem data para sua conclusão.

 

Giacomo Puccini.