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A alma de Virgínia Woolf

Crítica inglesa mergulha em profundidades abissais e faz o leitor de Navegos transitar pelo complexo mundo da criação da autora de Orlando e Passeio ao Farol, obras que revolucionaram a literatura modernas.

*Franklin Jorge

Em ensaio crítico-biográfico sobre Virginia Woolf, Nadia Fusini – sua mais original e eminente exegeta – pondera que o escritor não tem outra vida senão a obra; a obra que justifica a existência, e a única forma possível de imortalidade, segundo a lição prodigada por Marcel Proust.

“Sou Dona de minha Alma” faz a psicanálise dos escritos e da vida da autora de Mrs. Dalloway. É um estudo que surpreende e enreda o leitor da primeira à última página numa sucessão de descobertas, revelações, fatos e lembranças que dão vida e fluidez ao fluxo da consciência, uma das artes de Virgínia. Mergulha Nadia Fusini, sem temor, no mar profundo que constitui a natureza íntima dessa escritora inglesa que amava as mulheres e que, quando menina, foi abusada por um meio-irmão. Nos anos de 1940, deprimida, cometeu o suicídio enchendo de pedras os bolsos de seu casado e atirando no rio de sua sofrida juventude..

Ao compor este ensaio, Nadia Fusini, palmilha e esquadrinha o que escreveu Virgínia em diversos gêneros literários. Romance, crônica – uma tradição inglesa a que presta homenagem fazendo-se cronista de Londres, uma original cronista que lança os seus olhares sobre o excêntrico da alma londrina -, diários, cartas, fragmentos de memória, Bloomsbury, tudo enfim que escreveu…Enfim, o segredo de Virgínia Woolf decifrado e interpretado por Nadia Fusini, anglicista de renome cuja obra resgata a confiança do leitor numa crítica orgânica, antidogmática, inovadora; crítica que é uma contribuição literária em si e a um tempo uma profunda reflexão sobre o ato da escrita, vivenciada em todas as suas possibilidades e prejuízos que acarreta para o artista. Virginia, que ouvia pássaros cantando em grego e vozes se digladiando em sua mente, é submetida a rigoroso escrutínio nas páginas desse notável ensaio de alta literatura.

Revela-nos Nadia Fusini que a flor de Virgínia era a Passiflora, a flor do maracujá e da Paixão; e o seu éden, a casa de praia de St. Ives, na Cornualha, onde sentiu a qualidade do ar de seus dias de juventude, do ar de Talland House, cortante, fustigante, quando cai do alto. Era um ar que tirava do som aquilo que os sons têm de áspero, como o ar que circunda o Farol.

A autora de Orlando – uma biografia,  acredita que apenas a autobiografia é literatura. Por isso, afirma: Os romances são a casca, e, ao final, chega-se ao caroço. Ou eu, ou você. Assim escrevia em seu diário. Ora – pergunta-nos Nadia Fusini. – É possível conhecer-se contando as coisas simplesmente como aconteceram? E assim, dialeticamente, introduz o leitor no conhecimento ativo da alma dessa complexa Virgínia Woolf, por entender que a forma deverá ser extraída da liberdade, e não sofrida pelas circunstancias.