*Franklin Jorge
Instalado em sua própria casa, em Nova Betânia, Marcos Almeida criou e mantém uma pequena e bem estruturada loja de livros, discos e cds usados que tem a particularidade de só abrir ao público uma única vez por semana, aos sábados. Seu nome já diz tudo – Sêbado. Semanticamente um achado digno de Joyce. E, também, uma filosofia de vida de um bem-sucedido profissional da Odontologia que encontrou nesse deleitoso e honesto comércio uma forma de homenagear e engrandecer a sua terra sem fazer uso do dinheiro público.
Apreciador duma boa conversa e amante dos livros, da música e da gastronomia, é Marcos Almeida, além de um dos homens bons de Mossoró, generoso e delicado anfitrião, animador de um dos raros e talvez único centro cultural da cidade onde viu a luz pela primeira vez e que ele homenageia duma maneira original e simpática, recebendo-nos em torno de uma ampla mesa, onde o papo rola solto, adubado de caldinhos, de feijoadas, de dobradinhas, sucos e – por que não? – de um ou outro cálice de aguardente da melhor procedência mineira e nordestina.
Recentemente estive lá mais uma vez, levado por Kydelmir Dantas, bom amigo e habitué dessas tertúlias — quando os seus estudos do cangaço e a Petrobrás lhe dão alguma folga, claro. Fui encontrá-lo, feliz da vida, ao lado do seu velho pai João Batista de Almeida, de amigos, artistas, poetas, repentistas e simples curiosos. Estavam lá, nessa manhã, se a memória não me trai, Antonio Francisco, a doutora Graça Lopes, José Wellington, Genildo Costa, Niélcio Roldão, Nilson Gurgel, Luis Gomes Uchoa, entre outros bons conversadores. O editor Gustavo Luz era o único calado dessa animada roda. Enfim, uma esplêndida confraria dedicada ao serviço da cultura de Mossoró.
Música, poesia, humorismo, memória – a grande provedora das artes e da criação –, num amálgama delicioso de insights e revelações, fazem a crônica do Sêbado, desde já uma instituição da cidade de Santa Luzia, ao manter viva uma tradição criada pelos romanos clássicos, a do ócio com dignidade. Em meio a tudo isso a evocação dos mortos que deixaram um legado cultural, como esse Onésimo Maia, cantador dos bons, em boa hora lembrado por Niélcio que lhe recordou a verve e as peripécias.
Cantava Onésimo quando o ex-governador Aluizio Alves, de passagem pela cidade, entrou no recinto da cantoria acompanhado por partidários e pelos indefectíveis xeleléus e puxa-sacos. Ouviu-o por alguns momentos e, ao sair, tirou uma cédula da carteira e a colocou no bolso da camisa de Onésimo, que havia pouco recebera dum abastado mossoroense gorda gratificação que fora colocada nesse mesmo bolso. Agradecido, o poeta improvisou, cheio de si, para gáudio de todos:
Agradeço a Aluizio
Que aqui compareceu,
Mas eu vou olhar agora
Quanto foi que ele me deu,
Pois do jeito que é sabido
Pode ter roubado eu.
Aluizio sorriu sem graça, diante da verve do cantador, enquanto estrugiam os aplausos da platéia, encantada com o repente de Onésimo Maia, cantador e mestre violeiro, uma das glórias de Mossoró, ainda vivendo na lembrança de seus admiradores, apesar do silêncio que os gestores da cultura oficial mantém em torno do seu nome, como o da Poesia, imortal e pobre.