*Francisco Alexsandro Soares Alves
Agosto é um mês wagneriano para os amantes de ópera, porque é sobretudo nesse mês que o Festival Wagner, em Bayreuth, anualmente, se realiza desde 1876. Essa festividade aumentou ainda mais a áurea mística em torno da figura e da música do alemão. Rimbaud dizia que a música de Wagner era “esotérica”. O deslumbramento que o século XIX e uma parte do século XX tiveram por Wagner ultrapassou os limites da música e teve seu lugar em todas as artes. Sobretudo a literatura, com exceção da música, foi a arte que mais germinou em solos wagnerianos. E de muitas maneiras. As mais notáveis e profundas são as páginas de “Em Busca do Tempo Perdido”, de Proust. Porém, nesse artigo, comentarei sobre outros escritores, poetas. Aqui em Navegos há diversos artigos sobre Proust, clique na lupa na página de abertura.
Transcreverei alguns poemas de Augusto dos Anjos e de Mallarmé em que imagens wagnerianas fornecem o norte para a contemplação estética de quem os lê. Augusto dos Anjos escreveu dois poemas com imagens wagnerianas: “Numa Forja” e “O Canto dos Presos”. A forja é uma imagem constante na poética sonora de Wagner e “Numa Forja”, além da associação imagética, temos também Augusto dos Anjos emulando o estilo aliterativo wagneriano:
“Como que a forja tétrica
Num estridor de estrago
Executava em lúgubre crescendo
A antífona assimétrica
E o incompreensível wagnerismo aziago
De seu destino horrendo!”
Além do termo “wagnerismo”, outros, ligados à música, também surgem: “crescendo” e “antífona”. E também: essa estrofe contém aliterações múltiplas, estilo característico da escrita poética de Wagner: “Como que a forja tétrica / Num estridor de estrago”
No “Canto dos Presos” lemos: “No wagnerismo desses sons confusos”. Ao colocar em um mesmo verso “wagnerismo” e “confusos”, dos Anjos reproduz parte do pensamento que se tinha sobre a música wagneriana: caótica, barulhenta e carente de melodias. E, para terminar, um soneto de Mallarmé. Sobre este soneto escreverei um outro artigo.
Pois é preciso a morte para saber o Mistério
Silêncio de um tecido em seda cinerário
Mais que uma só dobra pode desdobrar
Sobre o móvel que a queda de um grande pilar
Derroca com a memória em estado precário.
O nosso antigo embate triunfal do glossário
Em cifras, hieróglifos de que o milhar
Se ergue a ressoar com a asa um fremir familiar!
Guardem-no, para mim, melhor, no armário.
Do ridente fragor original odiado
Por entre as claridades mestras viu-se alçado
Até um adro nascido para simulacro,
Trompas fortes de braço ouro sobre velinos,
Richard Wagner, o Deus, a irradiar ritual sacro
Que a tinta mal cala em soluços sibilinos.