*Oliver Harden
Umberto Eco, ao afirmar que “O que realmente torna um livro grande é sua capacidade de nos fazer ler nele algo que nunca esteve escrito”, expõe uma verdade fundamental sobre a literatura e, por extensão, sobre a natureza da interpretação humana. A leitura nunca é um ato passivo; ela não se resume à decodificação de palavras impressas em uma página. Pelo contrário, um grande livro não apenas transmite ideias, mas abre espaço para que o leitor projete suas próprias inquietações, experiências e percepções no texto.
A literatura se diferencia das demais formas de comunicação justamente por essa sua capacidade de multiplicidade de sentidos. Diferente de um discurso objetivo, um grande livro não é uma mensagem fechada, mas um organismo vivo, sempre em movimento, dialogando de maneira única com cada leitor. Assim, a genialidade de uma obra literária não se mede apenas pelo que está escrito, mas pelo que ela desperta na mente de quem a lê.
Nietzsche já alertava que “não existem fatos, apenas interpretações”, e essa máxima se aplica perfeitamente à literatura. Quando lemos Dostoiévski, por exemplo, não apenas encontramos um estudo sobre a alma russa do século XIX, mas nos deparamos com dilemas existenciais que ecoam até hoje. Um leitor pode ver em Crime e Castigo um tratado sobre culpa e redenção, enquanto outro percebe uma profunda crítica às ideologias revolucionárias. Ambos estão certos, pois um grande livro não impõe um único significado, mas permite que múltiplas verdades coexistam dentro dele.
O conceito da leitura como um ato de recriação encontra eco na teoria do “leitor ativo”, desenvolvida por Roland Barthes e Umberto Eco. Segundo Eco, o texto é um “campo de possibilidades”, onde o autor apenas sugere, enquanto o leitor completa, resignifica e até contradiz. Dessa forma, a leitura é sempre uma cocriação: um livro nunca é o mesmo para dois leitores diferentes, e nem para o mesmo leitor em momentos distintos da vida.
Essa perspectiva desafia a concepção de que a literatura é apenas uma transmissão linear de informações. Um texto não é um depósito estático de verdades absolutas; é, antes, um labirinto de significados que se desdobram e se recriam continuamente. É por isso que as grandes obras resistem ao tempo: elas não envelhecem, pois não pertencem exclusivamente à época em que foram escritas, mas à eternidade da interpretação.
Portanto, um livro verdadeiramente grandioso é aquele que nos faz ver além do que está escrito, que nos obriga a ler nas entrelinhas, que provoca reflexões que transcendem suas próprias páginas. A literatura não é apenas um espelho da realidade, mas um convite para que cada leitor enxergue, nela, um reflexo singular de si mesmo e do mundo.