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A Importância Da Crítica, Querido Ernesto?

Nada é mais delicioso na literatura vitoriana do que Oscar Wilde e seus diálogos espirituosos sobre arte, música, política, moda… Aqui, um trecho de um diálogo entre Ernest e Gilbert, sobre arte e crítica de arte.

*Oscar Wilde

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ERNEST: Estou pronto para admitir que errei no que disse sobre os gregos. Estes eram, como você iniciou, uma nação de críticos de arte. Admito e sinto um pouco de pena deles. Porque a faculdade criativa é superior à crítica. Na realidade, uma comparação entre os devidos não pode ser estabelecida.

GILBERT: A antítese entre eles é totalmente arbitrária. Sem a faculdade crítica não há absolutamente nenhuma criação artística digna desse nome. Você falou há pouco desse espírito fino de escolha e instinto seletivo delicado com o qual o artista faz a vida para nós e lhe dá uma perfeição momentânea. Pois bem: esse espírito de escolha, essa habilidade sutil de omissão, é na verdade a faculdade crítica em uma de suas formas mais características, e quem não possui essa faculdade crítica não pode criar arte. A definição de literatura de Arnold, segundo a qual ela é uma crítica da vida, não foi muito feliz em sua forma, mas revelou quão perspicazmente Arnold via a importância do elemento crítica em todo esforço criativo.

ERNEST: Tinha dito que grandes artistas trabalham inconscientemente, que são “mais inteligentes do que supõem”, como Emerson observou em algum lugar, eu acho.

GILBERT: Na verdade não, Ernesto. Todo belo trabalho imaginativo é autoconsciente e intencional. Nenhum poeta canta porque deve cantar. Pelo menos nenhum grande poeta o faz. Assim é agora e assim sempre foi. Às vezes somos levados a pensar que as vozes que ressoaram no alvorecer da poesia eram mais simples, mais frescas e mais naturais que as nossas, e que o mundo contemplado pelos poetas primitivos – no qual eles se moviam – tinha uma espécie de qualidade poética própria e poderia passar para o canto quase sem nenhuma transformação. Agora a neve é ​​espessa no Olimpo e suas encostas íngremes são estéreis e desoladas, mas em outros tempos, deve-se supor, os pés brancos das musas escovavam o orvalho das anêmonas pela manhã e Apolo vinha à noite para cantar para os pastores do vale. Mas, pensando assim, estamos simplesmente concedendo a outros tempos o que queremos, ou pensamos querer, para o nosso. A culpa é do nosso sentido histórico perdido. Todo que século produz poesia é, a esse respeito, um século artificial, e a obra que nos parece o produto mais natural e simples de seu tempo é sempre o resultado dos esforços mais conscientes. Acredite em mim, Ernest: não há arte bonita sem autoconsciência, e autoconsciência e espírito crítico são a mesma coisa.

[…]

Devemos nos ater às críticas. E o que eu quero apontar é o seguinte: uma época sem crítica é uma época em que a arte é imóvel, hierática e restrita à imitação de tipos formais, ou uma época que não tem arte alguma. Houve momentos que críticos que não foram criativos no sentido comum da palavra, momentos em que o espírito do homem tentou colocar os tesouros em seu cofre em ordem, separar o ouro da prata e a prata do chumbo, fazer contar as joias e nomear as pérolas. Mas nunca houve uma era criativa que também não tenha sido crítica. Porque é a faculdade crítica que inventa novas formas. A criação tende a se repetir. É ao instinto crítico que devemos cada nova escola que surge, cada novo molde que a arte encontra ao nosso alcance.

Oscar Wilde
Ó crítico como artista

“Eu não gosto da forma como ele confere ao real um tom insuspeito, o que você acha desse verde, querida?”