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A Melancolia da Estrela

Alexsandro Alves, escritor e professor, dialoga com o abismo que é Clarice Lispector, fala de determinadas emoções e estados de ânimo presentes em sua obra e detalha cinco pontos característicos de seus personagens.

*Alexsandro Alves

[email protected]

 

Ler Clarice Lispector é um problema pessoal. Todas as vezes em que li qualquer livro da autora foram de agonia sem fim. Seus livros são perturbadores, cruéis e melancólicos.

São melancólicos no que a melancolia tem de introspecção e ligação profunda com os sentidos, mas também, no que tem de triste, de arrasador, de apático.

Eu defino sua literatura como a estética da melancolia. Os personagens de Clarice não são criaturas sociais ou mesmo sociáveis, eles são criaturas estéticas.

A melancolia é a resposta mais precisa a um estímulo artístico e, dialeticamente, é a região emocional na qual a arte mais jorra fontes.

Não é exatamente essa melancolia que rasga nossa alma quando lemos qualquer frase de Macabéa? Ou quando fixos no espaço, quase inertes, como G.H., as cordas do tempo movem nossas emoções, suas marionetes invisíveis?

Essas mulheres de Clarice…

Há cinco pontos que percebo em seus livros, vou elencá-los abaixo.

  1. Os personagens femininos de Clarice são monstros abismais;
  2. Estes personagens possuem uma sinceridade infantil, beirando a desfaçatez;
  3. Guardam estranhas maldades, que são despercebidas ou encobertas pelo todo da narrativa;
  4. Por isso, algumas vezes, parecem tolos ou ingênuos;
  5. Possuem uma certa dose de sadismo ou masoquismo.

O estilo narrativo de Clarice, sempre tornando seus parágrafos tão fragmentários quanto pesadelos, livro após livro, os fazem parecer flashes, algo como retalhos costurados.

Ela introduz na narrativa, levemente, digamos, algumas questões sociais. Mas é tão discreta. G. H. se admira que o quarto da empregada esteja tão limpo! E isso em apenas umas poucas expressões de espanto.

Mas essa economia da autora é sempre tão bem colocada, que paramos perturbados. Não é nada demais, a narrativa nem se concentra nesses pontos, exceto em Macabéa, mas G. H., quando observa o quarto de sua empregada e constata uma limpeza insuspeita, soa como um LP arranhado: é só um detalhe, porém incomoda. Não nos passa despercebidos e põe uma tez nova em G. H., que nos parágrafos seguintes mergulhará em sua própria imundície.

Odilon Redon: Olhos Fechados (Les Yeux clos, 1890).