• search
  • Entrar — Criar Conta

A poesia do futuro será um sopro

Colaborador de Navegos evoca um dos mais importantes poetas de todos os tempos, influenciador de Baudelaire, admirador e cultuado por mestres, como Jorge Luis Borges.

*Alexsandro Alves

[email protected]

Após publicar seu poema “O Corvo”, Poe confessou a um amigo que, embora seu poema fosse longo, “a poesia do futuro será pequena”. O termo “futuro” é o preferido de muitos artistas do século XIX, porque os avanços tecnológicos daquele século marcavam os indivíduos com uma sensação de eternidade, além disso, ainda havia a crença no futuro da humanidade atrelado ao desenvolvimento da tecnologia. A Grande Guerra poria qualquer esperança nesse sentido abaixo. A Segunda Guerra confirmaria a vocação humana para a crueldade. Nas décadas seguintes, veríamos o avanço quase inacreditável da ciência, da tecnologia, das conquistas astronômicas, dos feitos militares, do software ao lado da fome e da miséria na África ou do desmantelo social na América Latina, com suas veias sempre abertas. Uma imagem que me vem à mente é a de Armstrong pisando o solo lunar americano e exclamando a famosa frase do pequeno passo para ele, porém grande para a humanidade. Qual humanidade? As conquistas espaciais não reverberaram em melhorias sociais. Não creio que este seja o futuro que os oitocentistas falavam.

Mas e sobre a poesia do futuro? É uma espécie de terra devastada – sem trocadilhos com Elliot. De fato, a poesia de nosso tempo é pequena, minimalista. E isso é espelho de nosso tempo. A tecnologia avançou em passos largos: hoje podemos resumir nossa existência a um aparelho de “smartphone”, não foi apenas a poesia que encolheu – a vida encolheu antes. Daí seria justo “linkar” a poesia minimalista ao minimalismo das experiências sociais, hoje? Li que o “poetrix”, uma forma de poesia minimalista, seria uma poesia adequada, vejam só, não à vida comum, mas à vida cibernética. O espaço da poesia mudou. Ela não está mais na vida comum, migrou para a Internet. Para a velocidade dos códigos binários. Uma poesia rápida, para experiências sociais virtuais. Até mesmo as opiniões de valoração encolheram, basta um “emoji”. Trocamos o verbo pela imagem, isso também é moderno. E a modernidade desumaniza. Porque somos discurso. A objetividade da palavra que desencadeia milhões de interpretações subjetivas, reduziu-se a uma sorridente expressão amarela e seus irmãos.

A tecnologia mostrou isso antes. Porém nossa contemporânea aversão ao “textão”, como se diz sobre textos de mais de 144 caracteres na rede, é filha desse processo. A última grande novidade tecnológica, que levou em consideração o humano em seu sentido civilizatório, foi a imprensa de Gutemberg, e com ela, a maravilha poética maior de abrir um livro e ser um com seu autor. A tecnologia moderna está mudando o significado de ser humano. Hoje, pouco se comemora de fato algum feito tecnológico, sabemos que será ultrapassado em seis meses. Não há mais tempo para o deslumbramento, para o ato de se maravilhar. E se há, o próximo “reels” ou o próximo “story” ou mesmo a urgência de anunciar nosso “status”, tornam o maravilhamento um “drops”. Porque antes, o homem dominava a tecnologia, hoje é o contrário. A dominada é a vida. Vinte e quatro horas é o tempo limite de existência para qualquer novidade. Após esse tempo, tudo precisa perder o interesse, não é que não tenha mais, pode até ter, mas é urgente que perca, pela novidade. Tudo se reduziu. Tudo tornou-se rápido. A vida e a poesia, inclusive.