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A política do RN, uma Capitania Hereditária

Colaboradora de Navegos toca um ponto nevrálgico da crônica politica de um estado que sorrateiramente, por falta de lideranças comprometidas com a sociedade, transformou-se com o passar dos anos em uma monarquia representativa.

*Nadja Lira

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As conversas entabuladas pela avó materna eram ricas em ditados populares, das quais só hoje percebo a riqueza filosófica que elas encerram. Ela costumava dizer, por exemplo, “que cada um colhe aquilo que planta”, ou “quem não pode com o pote que não pegue na rodilha”, ou ainda “quem nasceu para cangalha jamais chegará a ser uma sela”, e outras frases do gênero as quais ficaram marcadas na minha memória.

Hoje já adulta e mais afeita ao sentido que tais frases encerram, dou-me ao luxo de acrescentar outras, ao repertório da minha avó. Desse modo, também tenho cunhado algumas frases e, assim como a minha avó, espero poder deixa-las para a posteridade.

A principal delas refere-se à Cidade do Natal, Capital do Rio Grande do Norte. A cada vez que olho para a cidade que teve a honra de abrigar o grande mestre Câmara Cascudo, não posso evitar o pensamento que me vem à cabeça: Natal é uma província pensando que é metrópole. Por outro lado, também penso que se não fosse a mediocridade que impera entre seus governantes, Natal poderia ser uma das mais prósperas capitais do País, especialmente na área do Turismo.

A cidade que leva o nome de Natal teria tudo para ser um polo turístico natalino durante o ano inteiro, a exemplo do que ocorre em Gramado, onde tudo é fabricado, produzido com o objetivo de atrair a atenção de turistas do mundo inteiro. O problema é que, em Gramado, diferentemente de Natal, o povo e o poder público se uniu para transformar a cidade num grande gerador de trabalho e renda. Aqui, nosso poder público apenas esbanja dinheiro e usurpa o quanto for possível, o dinheiro do povo.

Os vereadores de Natal, legítimos representantes do povo, passam duas ou mais legislaturas sem apresentar um único projeto que contribua de alguma forma, para melhorar a vida da população. Quando o fazem, dá até vergonha de se falar a respeito. Um dos vereadores de Natal, por exemplo, instituiu o dia 26 de abril como o Dia do Cão Guia, projeto que foi aprovado em primeira instância. Nada contra o cão guia, que inegavelmente presta um relevante serviço a seu dono, mas instituir um dia para o animal, é muita falta de criatividade enquanto sobra ao autor do projeto, vontade de aparecer.

Aliás, o nível de uma boa parte dos vereadores com assento na Câmara Municipal da Cidade do Natal, é de fazer vergonha a qualquer cidadão de bem e que tenha um mínimo de educação. No plenário não existe conversa, diálogo ou discussão produtiva, argumentação em defesa de ideias. Existe agressão verbal, impropérios, insultos, ofensas. Falta pouco para que as excelências partam para a agressão física.

Qual é o prazer que um cidadão pagador de impostos pode ter em assistir a um pronunciamento na casa do povo, se boa parte dos seus representantes legais, não têm condição para elaborar uma frase simples, que contenham um sujeito, um verbo e um predicado? Deve-se aqui, resguardar as devidas exceções, é claro. Também vale ressaltar, que o papel de um vereador é, além de ser a voz do povo das comunidades que o elegeu, o de fiscalizar as ações do prefeito. Aqui em Natal, porém, estas atribuições só existem mesmo no papel.

O pior é ver que em Natal e em todo o Rio Grande do Norte, os cargos políticos são iguais às Capitanias Hereditárias e como tal, passam de pai para filho, como é o caso do ex-vereador Adão Eridam, que passou sua cadeira para o filho. Depois que Aluísio Alves passou o bastão político para sua prole, a prática virou moda. Assim, o exemplo de Aluísio passou a ser seguido por herdeiros de diversos políticos.

Na relação existem nomes como Henrique, Garibaldi, Carlos Eduardo e Walter Alves, Jacó e Eriko Jácome, Fábio Faria, Beto e Larissa Rosado, Márcia Maia, Júlia Arruada e mais uma infinidade de herdeiros políticos no Rio Grande do Norte. No que se refere à política, o RN mais parece uma capitania Hereditária.

Os cargos também são repassados entre irmãos, conforme ocorreu com o ex-vereador Aquino Neto, que impossibilitado de voltar ao cargo, elegeu o irmão. O mais curioso é o caso de Júlio Protásio, que acusado de ser membro na Operação Impacto, deixou ocupando sua cadeira na Câmara Municipal, para a esposa, Ana Paula. Haja paciência para aturar esta casta e tempo para cunhar frases filosóficas para a posteridade.

ILUSTRAÇÃO Pintura de Sante Scaldaferri, artista baiano.