*Franklin Jorge
Releio, quase 60 anos depois, após ouvir da boca de minha avó que lia como uma diseuse, as peripécias contidas nesse livro apaixonante e subliminarmente didático e instrutivo então publicado como um encarte da revista Realidade, precursora, em inovação editorial e conteúdos da Veja em seus empolgantes primórdios. Refiro-me à Revolução dos bichos, de George Orwell.
Ouvia-a, como sempre, depois do almoço, a cabeça repousando sobre seus joelhos, a crônica desses infelizes animais escravizados na fazenda modelo que lhes servia de cativeiro e câmara de tortura e seria, segundo explicara ao menino curioso e inquieto que que fui, Naqueles anos finais de minha infância rural, um representação do regime socialista, contado para crianças; um mundo, enfim, que inexoravelmente nos espreitava com todas as suas dissimulações, armadilhas e perversidades capazes de nos roubar a alma.
A edição mais recente, que tenho em mãos, se enriquece extraordinariamente com a apresentação de Clovis de Barros Filho, autor desse ensaio profundo e inteligente, escrito com o intuito de nos introduzir no universo de ideias do escritor inglês e, dessa forma, ampliar o nosso conhecimento da realidade.
Municiado de conhecimento e percepções surpreendentes que delatam uma cultura humanística enciclopédica, Clovis de barros Filho nos dá uma aula que sintetiza de maneira clara uma vasta biblioteca, ao tempo em que dimensiona o professor e leitor infatigável que, ao mesclar Conhecimento e sua própria experiencia pessoal, consubstanciada em vivencia e erudição.
Obra de um pensador que se opõe a ideias hegemônicas, ao traduzir em termos claros e fluentes o que resulta duma boa educação, democratizando saberes e dando-nos perspectivas inovadores e criativas, segundo suas próprias palavras, que se fazem necessárias ao entendimento das coisas humanas. Certo de que o contrário disso é dogmatismo e facciosismo.
Quanto a Revolta dos bichos, propriamente dita, sobre a qual desejava escrever algumas linhas, deixo para depois. Por enquanto, vou reler o que escreveu o Prefaciador a título de introdução desta edição, o mestre sincrético Clovis de Barros Filho, um leitor a altura desta obra que se incrustou as leituras do menino que amava sua avó e os livros.
