*Franklin Jorge
Em seu prefácio à Comédia Humana, escrito em julho de 1842, apropria-se Balzac do que chama de “Lei de Bonald” e a amplia, em seguida, ao declarar que aquilo que faz de alguém realmente um escritor, tornando-o talvez até superior ao estadista, é uma decisão qualquer quanto às coisas humanas, e uma dedicação absoluta a princípios. “Maquiavel, Hobbes, Bossuet, Leibniz, Kant, Montesquieu são a ciência que estadistas aplicam”.
Ora, como afirmara antes o Visconde Louis de Bonald [1754-1840], filósofo e estadista que tanta influência exerceu sobre o próprio Balzac, “um escritor deve ter na moral e na política opiniões imutáveis, ele deve se olhar como um professor de homens; pois os homens não precisam de mestres para duvidar…”
Essa “decisão qualquer” quanto às coisas humanas, preconizada por Balzac, inclui naturalmente a obra por fazer, que deverá ter uma forma tripla: os homens, as mulheres e as coisas, ou seja, as pessoas e a representação material que elas dão do seu pensamento. Em síntese, os homens e a vida.
Balzac não escamoteia o interesse que em sua opinião desenvolve muitas inclinações ruins; por isso poucas obras propiciam muito amor-próprio enquanto muito trabalho, ao contrário, propicia infinita modéstia.
Pensador ex professo, dá-nos o autor de Ilusões Perdidas o conceito de estadista. Alguém que sabe ser o dono de si mesmo e dá aos acontecimentos o desconto que merecem. Alguém, como o escritor, que não se atém a grandezas artificiais e despreza as insignificâncias superlativas.
Transmutando em sua obra toda a Sociedade, captada com mestria e sagacidade na imensidão de suas agitações, Balzac confessa honestamente sua dívida com as grandes palavras de Bonald que para ele constituem uma regra; a lei do escritor.
Por isso pode dizer sem rebuços que o autor que não sabe suportar a artilharia da crítica não deve pôr-se a escrever. Assim como um viajante não deve se pôr a caminho contando com um céu sempre sereno.
Franklin Jorge – Escritor, jornalista e Ativista dos Direitos dos Animais