Cleudo Freire
Seu filho tem entre 7 e 11 anos, está conversando muito em casa, mas também na escola, a professora falou com ele sobre isso e não deu jeito, até já lhe enviou um recadinho reclamando, mas não mudou muita coisa. O que será que há de errado? Vamos refletir comigo sobre o suposto problema. Antes de dar início a reflexão, quero fazer uma afirmação categórica: fique feliz, o seu filho, provavelmente é saudável e está correspondendo exatamente ao seu estágio de desenvolvimento!
Este momento, que pode-se chamar de segunda infância, é um momento de muitas mudanças para os pequenos, mudanças radicais eu diria, já que estão na raiz. Eles não são mais os bebês da mamãe, nem são adolescentes ainda. Contudo, já começam a ensaiar e elaborar o mundo tal como gostariam que fosse. São muitas e incríveis descobertas. Sobretudo se já chegaram aos 9 anos, conseguem diferenciar o mundo real do mundo da fantasia. Já não perdem a noção de direção no parque, pois adquiriram um bom domínio aeroespacial, conseguem fazer raciocínios abstratos um pouco mais elaborados e por isso criam muitos diálogos internos, logo, se enchem de repertório para trocar com os pares. Agora respondam, onde é que encontram diariamente os pares? Na escola é claro. Por isso, é lá que põem em prática o diálogo e é justamente essa (conversa inconveniente) que os faz desenvolver habilidades cognitivas e relacionais importantes, além de uma relação afetiva com o contexto escolar que os marcará para toda vida. São operações mentais complexas e bem-vindas depois de um longo tempo desenvolvendo operações motoras e sensoriais.
Os conflitos surgem quando nós, adultos em volta, sejam parentes ou profissionais da Educação, começamos a metralhar a garotada com frases de efeito, comumente baseadas no senso comum, tais como: – você não era assim, o que está acontecendo com você? – Vamos parar com a conversa paralela! – Eu vou falar com os seus pais! – Desse jeito você não vai aprender nada! Dentre outras. Bom seria se tentássemos responder à essas questões, refletir sobre as frases que falamos. Queremos ser ouvidos e não aprendemos a ouvir. Perdemos assim, uma grande oportunidade de ajudá-los a incrementar ainda mais, suas mentes já tão produtivas. Desperdiçamos muito o potencial dessas pequenas usinas, enquanto eles estão gritando: – queremos produzir! Segundo o educador francês Celestin Freinet, toda ação coercitiva é paralisante. No caso, as ações coercitivas para esse estágio do desenvolvimento são relativas à restrição dos diálogos, um grande equívoco, não temos o direito de paralisar o despertar dessas habilidades nesses cientistas iniciantes. O papel da Educação, é justamente orientar a aprendizagem de acordo com as características individuais e os fenômenos coletivos.
Não há uma fórmula ou modelo de ação pré-definidos, mas, posso dizer que desenvolver atividades coletivas que partam do diálogo, que tragam desafios do tipo interpretação de texto para resolver um problema real, ou interpretar situações em que tenham de usar a imaginação, sugerir a criação de hipóteses sobre problemas da vida real que façam parte do seu contexto, são bons caminhos.
Se abrirmos espaços para expressão de interesses, meios de realização destes com possibilidade de observação, experimentação e socialização, teremos seguramente recursos eficientes de avaliação. Estes recursos, nos darão a real dimensão de onde estão nossos pequenos cientistas, a ponto de podermos propor a eles, desafios adequados, sabendo com muito mais precisão onde podem chegar. Pois isso – o sucesso escolar, o desenvolvimento humano, a aprendizagem, é o que realmente interessa.
São estes momentos felizes de descoberta, exposição e concretização de ideias, projetos, de compartilhamento com os pares que ficarão na memória de cada um e alimentarão suas almas, de modo que sempre terão uma atitude positiva diante dos desafios da vida, já que verdadeiramente passaram de ano, ou seja, se tornaram pessoas realizadoras.
Cleudo Freire. Pedagogo, especialista em educação e músico.