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Caicoense herói na Amazônia

O caicoense se destaca, na rude paisagem, por se fazer presente em toda a parte, por seus costumes e tradições descritas em “Resenhas da Bodega de Seu Leleco”, a pouco lançadas.

Ruy Medeiros Fernandes

Diversos caicoenses se notabilizaram na história contemporânea do País por episódios de bravura. Na Intentona Comunista de novembro de 1935, destacou-se a presença de caicoenses que se deslocaram para a Serra do Doutor, no município de Campo Redondo, e colocaram em debandada os comunistas que já haviam implantado um Governo Provisório em Natal e marchavam para a conquista do Seridó; na Segunda Guerra Mundial (setembro de 1939 a setembro de 1945) vários caicoenses se alistaram nas Forças Armadas e integraram a Força Expedicionária Brasileira que derrotou as forças do Eixo Itália-Alemanha-Japão em batalhas no solo italiano.

Mais remotamente, há registros de caicoenses que lutaram bravamente na Guerra do Paraguai (dezembro de 1864 a março de 1870) e alguns até morreram como heróis no referido conflito sul-americano.

Os séculos XIX e XX registraram grandes correntes migratórias de nordestinos para as Regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste do país como retirantes da seca que, dominados pela fome, abandonaram sua terra natal levados pela esperança de melhores condições de vida para suas famílias.

José Cezário de Medeiros (*1904+1980) foi um caicoense que migrou para o Estado do Pará no primeiro semestre de 1928, levando consigo a mulher e três filhos dela, havidos de um relacionamento anterior, que adotou como seus; aos filhos adotivos se somaram-se mais oito havidos do casamento dela com José Cezário.

Chegando ao Estado do Pará, José Cezário foi contratado para trabalhar em um empreendimento chamado Projeto Jari, tendo como local de trabalho a Selva Amazônica, próximo ao município de Arumanduba, onde se situava a sede da empresa.

Os seringueiros, recrutados majoritariamente nos Estados nordestinos, eram chamados “soldados da borracha”, em virtude de trabalharem na colheita do látex (líquido precioso que se constituiu na matéria prima da produção da borracha), extraído das árvores seringueiras.

As condições de trabalho dos seringueiros eram as mais inóspitas possíveis, com as famílias abrigadas em barracos ou tendas, sem água potável (apesar da imensidão de água na Amazônia) e sob riscos de contrair doenças causadas pelas picadas dos mosquitos. A remuneração recebida pelos seringueiros ocorria mediante a troca por alimentos adquiridos nos barracões de propriedade dos patrões; dinheiro em moeda jamais chegava às mãos dos trabalhadores e seringueiro nunca conseguia pagar sua dívida ou obter algum saldo remuneratório. Esse regime de escravidão era agravado pela vigilância de jagunços armados pelos patrões. O seringueiro que ousasse fugir apareceria morto em emboscada na imensidão da Mata Amazônica.

No dia 5 julho de 1928 José Cezário comandou uma insurreição, que foi denominada “Revolta do Jari”. O motim contou com o envolvimento de cerca de oitocentas pessoas entre homens, mulheres e até crianças.

Nesse dia, os insurgentes iniciaram a revolta na selva; após tomarem as armas dos jagunços que subjugavam os seringueiros, seguiram para a Vila de Santo Antonio da Cachoeira, onde estava atracado o navio mercante Cidade de Almerim, responsável pelo abastecimento das filiais e recolhimento da produção extrativista.

Sob a liderança de José Cezário, os revoltosos prenderam o Comandante juntamente com toda tripulação e assumiram o controle do navio.

O proprietário da empresa Jari, coronel José Júlio (*1899+1948), acionou a Marinha para sufocar o levante. Ocorre que o líder da “Revolta”, caicoense José Cezário, no comando de um exército de famintos despojados de suas esperanças, não tinha forças nem desejo de revanchismo contra seus exploradores. Por isso determinou a seus liderados que jogassem na água as armas utilizadas no movimento de libertação.

As Forças Armadas deslocadas para sufocar a revolta, chegando ao navio, encontrou homens desarmados e famílias dominadas pela fome e doenças. Uma corveta da Marinha interceptou o navio com os revoltosos nas proximidades de Belém e liberou o comandante e sua tripulação.”

O Governador do Pará à época, determinou que fossem socorridos os revoltosos e seus familiares com alimentos e medicamentos e encaminhassem a seus Estados de origem aqueles que não quisessem permanecer no território paraense.

O episódio teve repercussão nacional, a ponto de se transformar em romance de autoria de Jarbas Passarinho, com o título de “Terra Encharcada”, cuja obra foi contemporânea do levante conhecido como “Revolta do Jari”, tendo a edição se esgotado em pouco tempo.

Em 1968 foi impressa a segunda edição que, inclusive, teve lançamento naquele ano no auditório da Reitoria da Universidade do Rio Grande do Norte pelo autor, então Ministro da Educação do Governo Emilio Garrastazu Médici, com a presença de familiares do herói nacional José Cezário de Medeiros, caicoense que é retratado na obra como “o brabo”.

Do site Alma Acreana foi extraída sinopse acerca da obra de Jarbas Passarinho, assinada por Isaac Melo, para que os leitores compreendam a abordagem do tema que motivou a edição do romance Terra Encharcada.

Rui Medeiros Fernandes, advogado  da Advocacia Geral da União (AGU), dentista e escritor