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Carta da Marquesa de Merteuil ao Visconde de Valmont

Colaborador de Navegos, autor de livro sui-generis que recolhe a correspondência real e imaginária entre autores e personagens torna pública carta escrita por personagem de As relações perigosas enviada a seu cúmplice.

*Cleber Pacheco

Estou ciente de que jamais poderá receber esta carta, meu caríssimo Valmont, mas mesmo assim a escrevo. Sei que é tarde e que está morto. Todavia, escrevo. Uma última palavra é necessário.

Tiveram êxito todos os nossos planos de sedução, de destruição e vingança e deles extraímos muitos prazeres. É verdade. Tivemos o controle em nossas mãos. Fomos poderosos e desfrutamos cada conquista e sedução, extraindo a sordidez até mesmo da inocência, destilando o mais puro veneno do mais doce néctar.

Tal arte é para poucos, para artistas como nós, de rara excelência e talento. Afinal, nascemos para isso.

No entanto, meu querido Valmont, a arte é finda. Agora nada resta. Todas as minhas vitórias resultaram em irremediável de Diante disso, é preciso que eu diga: sim, havia entre nós um sentimento genuíno e soubemos ocultá-lo.

Não usarei a infame palavra amor. Não definirei, não darei nome a esse sentimento. Mas agora é preciso admitir: havia algo e sou obrigada a reconhecê-lo.

Por isso resta-me amaldiçoá-lo por ter despertado esse intruso a consumir meu peito. Ao final, você venceu. Chamam-me má e pérfida. Mentira. Perverso, na realidade, é você. E eu o odeio. Eu o desprezo e cuspo sobre seu túmulo. Está morto. Pois arda para todo sempre nas profundezas do Inferno.

Em destaque, cena do filme inspirado em As relações perigosas; acima, o escritor Chordelos de Laclos, autor do romance.