*Alexsandro Alves
A Atriz Claudia Raia retorna aos palcos em um espetáculo que interpreta a pintora modernista Tarsila do Amaral (1886-1973).
Tarsila foi um dos ícones do modernismo de 1922, fazendo parte do famoso Grupo dos Cinco (juntamente com Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Menotti del Picchia e Anita Malfatti).
A encenação de Claudia Raia, um musical, foca na relação tumultuada entre a pintora e o escritor e poeta Oswald de Andrade.
Oswald, que nunca escondeu seu lado mulherengo, em algum ponto do relacionamento resolve abandonar a esposa e iniciar uma relação íntima com Patrícia Galvão, chamada Pagu, escritora e poetisa – alguns afirmam que o relacionamento já iniciara bem antes da separação entre ele e Tarsila.
Ainda não vi o musical, que ainda não chegou em Natal, porém o que pode me chamar a atenção nesse momento é a semelhança, ao menos nesses primeiros contatos com o espetáculo, com a ópera de Norma, de Bellini.
Melhor dizendo, com uma certa interpretação de Norma.
Estou falando da produção de Guy Joosten, com Hasmik Papian (como Norma), para Amsterdã, 2005.
Norma é sobre uma sacerdotisa druida que, embora tenha feito votos de castidade, mantém um relacionamento com um general romano. Este acaba traindo-a, trocando-a pela aia e confidente de Norma, Adalgisa.
Na visão de Joosten, Norma é sobre uma artista mais velha que é traída pelo amante, que prefere uma diva mais nova. Na cena, que se passa entre camarins, Adalgisa é cantada por uma cantora de fato bem mais jovem que Papian.
Pagu, que conhecera o casal Andrade ainda bastante jovem, torna-se o pivô dos conflitos entre o casal modernista.
Como ainda não vi o musical, isso são apenas conjeturas através de minhas referências pessoais.
Mas por que essa encenação é importante?
A obra retoma uma capítulo dos mais intensos e interessantes de nossa cultura ao colocar personagens da máxima importância para o desenvolvimento da alta cultura nacional no palco. Porque precisamos de nosso passado, dos ícones que nos antecederam, por respeito a nossa memória e à cultura do país – cultura essa que, ano após ano, é solapada por governos incapazes.
É de obras assim que precisamos. Obras que apresentem os grandes artistas brasileiros, homens e mulheres que marcaram o desenvolvimento de nosso espírito, de nossa forma de pensar, de nossa vida intelectual.
Precisamos porque o atual estado civilizatório brasileiro é de ameaças a tudo o que nos formou. Precisamos resgatar os ícones de nossa passado, que não foi um passado menor! Devemos dialogar com a tradição, apresentando-a em novos contextos, mas nunca permitir que seja esquecida. Só existe avanço conservando o que há de excelência no passado, a memória de um povo é construída assim.
Por isso que apoio essa encenação. Será um prazer estético, espiritual e intelectual sublime ver reencarnado no palco um momento maior de nossa vida cultural.