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Cleriston: morto nas masmorras do Estado

Silêncio de velório na morte do prisioneiro Cleriston! A primeira vítima da vingança estatal!

*Percival Puggina

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É desfaçatez dizer “súbita” morte tão anunciada!

Nenhum cartaz com seu nome foi levantado. Nenhuma ONG das muitas que zelam por direitos humanos dos bandidos de verdade registrou num pedaço de papel sua morte sob cuidados do Estado. Os Ministérios da Justiça e dos Direitos Humanos cuidavam de se livrar de visitantes incômodos.

Silêncio de velório. Fui atrás das notícias nos mais destacados veículos do jornalismo brasileiro. Parecia-me ler vários exemplares de uma mesma edição do Granma. Textos muito parecidos, absolutamente acríticos, cuidando de descrever os crimes pelos quais respondia e a atenção recebida pelo preso a partir de seu “mal súbito”.

A matéria publicada pelo UOL destaca-se pelo fastio de noticiar algo tão irrelevante. Começa assim: “Um homem preso por atos golpistas morreu hoje”. O nome do morto ficou para depois. Metrópoles partiu para a gozação informando, como se o morto estivesse em férias, que “Patriota” (assim, entre aspas) morreu durante banho de sol na Papuda…

No mais, são todos iguais, Globo, CNN, R7, Estadão, Folha: fato, cuidados recebidos, comunicações feitas, informações solicitadas. No final, acrescentaram, acriticamente, que “em setembro, a PGR se manifestou pela liberdade do detento, mas o pedido não chegou a ser examinado pelo ministro Alexandre de Moraes do STF”. Ponto. Ponto?

Sim, silêncio de velório. Velório do jornalismo companheiro ou medroso. Velório da Justiça, da comiseração para com um preso imunodepressivo, em péssimas condições, e dezenas de atendimentos médicos ao longo do ano. Não fosse Cleriston um preso político, ainda não condenado, estaria em casa ou no hospital que é o destino para onde o levaria um mínimo senso de humanidade. Mas mesmo esse mínimo só pode conceder quem tem.

Não fosse Cleriston um preso político, a mídia estaria gritando contra a brutalidade de alguém. Toda aquela sensibilidade das organizações voltadas para proteger direitos humanos dos companheiros estaria berrando em megafones. Nessas horas, porém, o despertador do seu mecanismo entra em modo “soneca”. Somente a oposição e o jornalismo discriminado, mas independente – exatamente como em Cuba – atribui ao acontecido a dimensão que de fato tem.

A Carta Capital destacou a ordem do ministro Alexandre de Moraes para que o presídio da Papuda encaminhe, com urgência, informações, prontuários médicos e relatório sobre o acontecido. Mesma urgência, aliás, não concedida ao apelo do réu e à recomendação da própria PGR ao ministro para que Cleriston, em vista de sua condição, fosse posto em liberdade com tornozeleira e requisitos de praxe. Quantos mais precisarão morrer para que as preocupações multitudinárias do ministro lhe permitam ver seus réus como pessoas concretas, titulares de alguns direitos mínimos, como o direito à vida?

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.