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Quando 2 + 1 Não São 3

Alexsandro Alves, escritor e professor, traça um quadro comparativo da coragem de três ex-presidentes em determinados e diferentes momentos cruciais de suas jornadas políticas: uma renúncia, uma prisão e uma derrota.

*Alexsandro Alves

[email protected]

Em 1992, o primeiro presidente eleito pelo voto popular após queda dos militares, era obrigado a renunciar para não sofrer o primeiro impeachment presidencial no Brasil, que já estava sendo votado no Senado. O então presidente Fernando Collor de Melo, alguns dias antes, em um momento crucial, fez um pronunciamento em que clamava ao povo brasileiro: “não me deixem só!”, a sua teatralidade, o povo respondeu com manifestações em todo o país, faces pintadas de preto e “Fora, Collor!”, nos lábios.

Em 5 de abril de 2018, o então juiz Sérgio Moro decretava a prisão do ex-presidente Lula. O condenado, ao invés de cumprir as decisões judiciais, preferiu ser dramático, assim como Collor, porém em um grau infinitamente maior.

Lula, nesse seu momento crucial, se dirigiu ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e, lá, formou seu bunker de resistência, cercado por militantes. As notícias diziam que Lula e seus advogados negociavam rendição com o juiz paranaense. Nas ruas, o Brasil comemorava algo nunca antes visto na História do país: um presidente seria preso!

O que Lula queria com sua dramatização naquele sindicato? O mesmo que Collor: chamar a atenção popular para si, transformar sua prisão em ato de guerra política e fazer o povo tomá-lo nos braços, uma revolução de um só homem! Porém o povo permaneceu apático. Uma parte comemorou, a outra, mais reduzida e composta basicamente por filiados ao PT, esperava, e a maior parte da população, jantava e assistia, pelo Jornal Nacional, William Bonner e Renata Vasconcelos entrarem com as últimas notícias sobre a tentativa revolucionária de Lula.

Nesses dois casos, temos políticos que confiaram sua permanência no poder no povo. Marx afirmava que um acontecimento histórico tende a se repetir uma vez, mas como farsa. Aqui, tivemos uma inversão da ordem. A primeira convocação do povo, feita por Collor, é a farsa; Collor, um marajá alagoano! A verdade dramática ocorreu com Lula. Seria coerente Lula acabar seus dias nos braços do povo pobre, sob um êxtase revolucionário? De certa maneira até que sim. Porque embora o PT tenha se afastado de seus ideais de outrora, hoje é um partido tão fisiocrata quanto um PL, ainda havia, ao menos, um simulacro de revolução.

O rock-pop em que o PT transformou o possível processo revolucionário, de qualquer forma, tornaria uma possível cena de rebelião das massas pró Lula, um item e tanto para a cultura pop, industrial e mercadológica.

Porém o povo, assim como com Collor, não deu a mínima.

Em 2022, após uma eleição tumultuosa e controversa, o então presidente Bolsonaro não conseguia sua reeleição, por muito pouco mesmo.

Diferente dos outros dois, este não clamou nada ao povo e nem fez gestos dramáticos. Ao contrário. Seu momento crucial ele conseguiu transformar no maior coito interrompido da república – ele não estava à altura.

Em um silêncio ensurdecedor, o dito parecia que havia ficado de mal da nação. À maneira daqueles moleques que perdem uma aposta, resolveu se intrigar do povo e simplesmente fugiu do Brasil para os Estados Unidos. O “imbrochável” abandonou a cama da nação, e deixou a noiva à mercê dos “ricardões”.

Mas, mesmo assim, algo ocorreu. O povo, em todas as partes do país, resolveu se solidarizar com a derrota do derrotado. Bolsonaro tem um exército. Um exército armado apenas com a cara e a coragem. Mas esse exército confiou no capitão errado. Foram semanas de humilhações, de promessas descabidas, as “72 horas”, para, por fim, o capitão se mostrar como de fato sempre foi: um chihuahua, não um rottweiler.

Explodiram memes, como aquele do rapaz triste, o deputado Tomé Abduch, na chuva; a zombaria infame do pen drive de Eduardo Bolsonaro, e os celulares na testa para uma comunicação interplanetária de alguns manifestantes em Porto Alegre.

Quanta vergonha.

E Bolsonaro? Nada. Latiu tanto para Alexandre de Moraes! Porém é um cachorro sem dentes. Suas FFAA, com as quais alarmava os noticiários, hoje falam pianinho, nem parecem aquele murro na mesa do general Heleno.

A coragem de Collor, sem noção, sem apelo histórico nenhum e ilegítima, é histriônica; a coragem de Lula ainda respira algo de vermelho, de sincero, mas envelheceu e ninguém acredita nela nem por um milésimo de segundo, é anacrônica.

A coragem de Bolsonaro é inexistente, não passa de um “acabou, porra!”.

“Porra!”? Não é pelo palavrão. É pelo morder e assoprar, pela molecagem, tantos brasileiros que estão presos, ou na iminência disso, por conta da confiança nas suas palavras, nos seus gestos, nas suas ações, e no fim, o capitão é um recruta, um moleque que tentou assustar a todos se cobrindo com um lençol de fantasminha na sala de estar de gente grande. Ele não merece o apoio que teve e que tem.