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Conversando com Sânzio de Azevedo

Nasceu Sânzio de Azevedo, poeta, escritor e ensaísta pertencente à academia Cearense de Letras, nasceu em Fortaleza, CE, no dia 11 de fevereiro de 1938, no dia em seu Pai fazia 46 anos de idade. Aqui ele conversa com o Fundador de Navegos que, por alguns anos, alimentou a ilusão que se foi de escrever um livro sobre a Cultura Cearense. Ouçamo-lo:

*Franklin Jorge

O pai de  Sânzio Azevedo, Otacílio,  era poeta e seu irmão velho, Rubens, que dedicava-se à Astronomia e `à arte do desenho, ilustrou de Maria Eugênia Maceira Montenegro, escritora mineiro-potiguar, Alfar a que está só, certamente terão de alguma forma o levado, se não a escrever, fazer-se digno dessa herança familiar.

Penso que isso me influenciou – afirma -, porque meu primeiro livro, A Terra Antes do Homem, publicado em S. Paulo quando eu tinha 24 anos, em 1962, falava de animais antediluvianos.

Sânzio, que é um dos nomes mais prestigiosos da literatura e da crítica cearenses, escrevo porque tem sempre coisas a dizer, sejam em versos ou seja em ensaio, o que tenho feito mais, tanto que já publiquei uns 30 livros que enriquecem a Literatura de sua terra.

Leu histórias em quadrinhos, em criança, mas aos 10 anos meu irmão me presenteou com Viagem à Aurora do Mundo, de Érico Veríssimo. Fiquei tão encantado com o texto e com as ilustrações de Ernst Zeuner que mandei uma carta ao escritor. E ele me respondeu! Não sei se ele guardou essa carta do grande escritor gaúcho, que, certamente, se lida hoje, nos teria muito aa dizer-nos. Guardou-a? Tenho vontade de perguntar-lhe e até de atrasar a redação desse texto para inserir-lhe a resposta ou talvez o resumo do que lhe dissera, há maquis de meio século, o autor de Incidente em Antares, um livro capital da língua brasileira.

No que toca ao poema, Sânzio acredita em inspiração: não é toda hora que o poeta compõe versos, reconhece, como ocorre na prosa, que escrevemos até para sobrevivermos financeiramente, em jornais e livros. Já o ensaio pressupõe a pesquisa, a construção de um texto objetivo, para mim, que o entrevistei, o mais caro dos gêneros literários, por pressupor pensamento, cultura e talento para dizer acerca do que não nos pertence.

Claro que a influência maior foi de meu Pai, Otacílio de Azevedo, juntamente com a de meu irmão Rubens de Azevedo, o astrônomo que em certa época teve ligações com o Rio Grande do Nore. Mas na adolescência conheci vários jovens que liam e escreviam poemas, o que me animou a fazer o mesmo. Em São Paulo, quando revisor d’O Estado de S. Paulo, aproximei-me de Guilherme de Almeida, que chegou a escrever a “orelha” dos meus Cantos da Longa Ausência (1966).

Pergunto-lhe que lembranças guarda de Carlyle Martins, que foi meu amigo e me incentivou a escrever quando eu teria aí, pelos quinze ou dezesseis anos. Creio até que ele, magistrado aposentado, chegou a escrever algumas linhas em um jornal de Fortaleza sobre o jovem do Ceaará-Mirim. Cheguei mesmo a visita-lo em sua casa, num dos bairros tradicionais de Fortaleza, uma casa antiga e sóbria, mas isto eu não conto a Sânzio, não por que.

Ele era amigo de meu Pai e, depois, meu. Poeta que veio do Parnasianismo, era autor de uma vasta bibliografia e escrevia artigos em jornais de Fortaleza. Era um incentivador dos jovens poetas. Eu ia muito à casa dele, cujo endereço ainda lembro, e conversávamos muito sobre coisas do tempo dele.

Lembra-se da circunstância em que ele morreu? Quero saber, pois com o tempo e minhas viagens, perdi-lhe o contato.

Nascido em 1899, sei que perdeu a visão perto do falecimento, em 1986. Escrevi um artigo, depois incluído em um dos meus livros. O artigo era “Carlyle Martins, o último parnasiano”.

Há uma Literatura Cearense?

Creio que sim, como há uma literatura norte-rio-grandense, uma gaúcha, uma paulista, etc. Não se trata de buscar cor local: para mim, o autor cearense não tem obrigação de falar em seca, em mandacaru, etc. Considero cearense aquele que não está contemplado na literatura brasileira. Mas os que se ausentaram a meu ver têm de estar ligados ao Ceará. E cito Rachel de Queiroz.

Sânzio costuma ver as transformações com naturalidade, e até as acompanha. Meus poemas mais recentes são bem diferentes dos primeiros que escrevi. Sá de Miranda, o introdutor do verso decassílabo em nossa língua, disse, num soneto célebre: “e tudo o mais renova, isto é sem cura!”

Quais, do passado e do presente, os autores cearenses a seu  ver mais representativos?

Difícil dizer. Mas eu citaria Juvenal Galeno, Rodolfo Teófilo, Adolfo Caminha, Domingos Olímpio, Antônio Sales, Oliveira Paiva, Cruz Filho, Júlio Maciel, Rachel de Queiroz, Jáder de  Carvalho, Artur Eduardo Benevides, Fran Martins, Moreira Campos, Francisco Carvalho. Citei só os mortos, e não citei

meu Pai. Minha Literatura Cearense (1976), que é história e antologia, e tem cerca de 600 páginas…

Não saberia descrever meu processo de trabalho, mas gosto de reescrever os textos. Aos 20 anos, mudei-me para S. Paulo, onde vivi por mais de 6 anos. Penso que isso pesou no que sou e no que escrevo.

Teve a infância de um menino de seu tempo, pobre, morando numa rua de areia, afastada do Centro (hoje está no Centro…), correndo com os amigos, em brincadeiras, trepando em árvores ou em casa, lendo revistas com histórias, muitas falando na II Grande Guerra…