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Crônica em estado crônico

Colaborador de Navegos, poeta e escritor, escreve sobre o desafio da página em branco e reconhece que não há maior desafio que romper coma inércia.

*Flávio Machado

Não há maior desafio a enfrentar para quem se aventura com a escrita do que a página em branco. Poderá receber desde grandes textos que na posteridade serão festejados, até a execração pela qualidade duvidosa do que se escreveu na melhor das intenções.

Nesse deserto com relativo sucesso precisa de muita força; superar a natureza indomável, livrando-se da falta de assunto, fera a espreita

Não há maior desafio do que ordenar as palavras de maneira clara para transmitir uma ideia, um ponto de vista, apresentar uma novidade em terreno de difícil semeadura, explorado a exaustão.

Retirar do estado de dicionário as palavras, armazenadas ao alcance das mãos e ao mesmo tempo intocáveis. A busca da transformação e criar um oásis em meio ao deserto. Em tempos em que há uma quantidade enorme de literatos e pseudo literatos, tempos de relativa facilidade de instrumentos a disposição dos aventureiros da escrita.

Criar a partir do absoluto vazio um texto, um poema, um livro, algo que represente a verdadeira expressão artística. Enfrentar o papel em branco em condições dissolutas dos tempos que vivemos; quem sabe arrancar raquíticos elogios.

Enfrentar esse espaço com o mínimo de respeito, humildade para reconhecer a finitude de qualquer expressão artística mal elaborada, efêmera trajetória, pequenez atávica, o sentimento egocêntrico do autor: poeta ou cronista. Na visão metafórica da fábula em que pergunta ao espelho: Haverá no mundo melhor escritor do que eu? Além do desafio de quebrar o bloqueio intelectual. Evitar qualquer expressão de auto júbilo.

Não há maior desafio do que transpor para o pequeno espaço em branco. Superar os obstáculos, produzir uma obra sem nenhum dos maneirismos e cacoetes da prosa atualmente escrita no país. Atravessar o deserto em segurança, derrotando os ataques dos inimigos, dos que pensam de forma diversa, os patrulhamentos ideológicos, as disputas sem sentido.

Em tempos onde existe há uma maneira de escrever como fosse um molde universal, facilmente reconhecido na leitura de alguns textos, onde se tem a impressão de ter lido algo semelhante.

Não há maior desafio do que quebrar a inércia, produzir um texto livre das fórmulas produzidas nas oficinas literárias, algo que possa ter reconhecido valor literário, rompendo com a banalidade geral da literatura nacional. Plantar nesse cenário uma forma revolucionária inovando e renovando a escrita.