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Curando os hospitais

Dr. Velvl Greene [1928-2011] foi um bacteriologista que atuou como professor de saúde pública na Universidade de Minnesota e na Universidade Ben Gurion, bem como diretor do Centro Jacobovits para Ética Médica Judaica em Be’er Sheva, Israel. Ele tinha trabalhado antes para a NASA, Divisão Quarentena Planetária, que foi encarregada de encontrar vida em Marte. Foi entrevistado em abril de 2008 por Chabad.org, mantenedora de revista semanal destinada a leitores da comunidade judaica.

* Velvl Greene

[email protected]

Meu trabalho como bacteriologista começou anos atrás quando houve uma explosão de um estafilococo resistente à penicilina que causou uma epidemia de infecções de estafilococos.

Naquela altura, eu estava fazendo muita pesquisa; estava procurando micróbios nas paredes de hospitais, nos ventiladores das lavanderias e nas salas de cirurgias. Fui muito bem sucedido em meu trabalho – desenvolvendo nacionalmente uma fama, e então internacionalmente, na área de controle de infecção, desinfecção, esterilização e quarentena.

Em 1969, me encontrei com epidemiologistas em Londres, que me pediram para conseguir um tempo de ausência da Universidade de Minnesota – onde eu estava ensinando e da qual eu tinha recebido um Ph.D em bacteriologia medicinal – a fim de passar alguns meses com eles aprendendo como as doenças se espalham nos hospitais e como as técnicas deles poderiam impedir isso.

As pessoas vão aos hospitais para ficarem curadas. Na verdade, essa é a função dos hospitais – curar as pessoas. Infelizmente, muitas vezes as pessoas vão aos hospitais e se tornam infectadas. É algo bastante insidioso, mas por que isso acontece? Porque pessoas doentes com todo tipo de doença vão aos hospitais – algumas com doenças infecciosas, entre outras. Então você tem todas essas pessoas juntas em um ambiente. Designar um sistema de isolamento entre elas não é algo fácil de fazer.

Os epidemiologistas em Londres estavam pesquisando a disseminação de infecções dentro das áreas de seus hospitais, e quando me convidaram para aprender suas técnicas, pedi a bênção para sucesso ao Rebe, com quem eu tinha criado um relacionamento no decorrer dos anos.

Fiquei muito orgulhoso quando fui convidado por essas pessoas para ir ao Hospital S. Bartolomeu, que estavam então à frente no estudo de epidemiologia de bactérias resistentes a antibióticos – dos quais um tinha sido nomeado cavaleiro pela Rainha da Inglaterra – e quando mencionei tudo isso ao Rebe, ele perguntou se eu poderia enviar a ele uma cópia do protocolo da pesquisa que eu pretendia fazer. Claro que fiz isso porque, para ser sincero, eu desejava que o Rebe ficasse impressionado.

O Rebe olhou meu protocolo e disse: “Muito, muito bom. Obviamente, não entendo a maior parte disso, mas você é o especialista na área, portanto lhe desejo grande sucesso. Mas, se você me perguntar, poderia ser um pouco melhor investigar um campo diferente.”

Fiquei chocado ao ouvir aquilo. Como eu poderia ir investigar outro campo após ter recebido uma oportunidade realmente histórica nessa área! Mas ele insistiu: “Por que você não tenta e estuda por que essas bactérias se tornam resistentes para começar? Se um micróbio é suscetível à penicilina e então se torna resistente, como ele se tornou resistente?”

“Oy veyiz mir! “ (Oh, meu Deus!”), pensei comigo mesmo.

Eu estava tão orgulhoso daquilo que iria fazer, mas sua sugestão iria significar que eu teria de mudar completamente o rumo da minha carreira. Teria de voltar para trás e aprender muita biologia molecular e genética, o que realmente não me interessava. Eu estava interessado no drama da epidemiologia, de estudar a transmissão de doença.

Na verdade, ouso dizer que todos os epidemiologistas amam a ideia de resolver um mistério. Há um drama em cortar uma cadeia de infecção – é disso que são feitos os filmes. Os filmes não são feitos da drogaria dia a dia da genética que somente biologistas moleculares entendem. Mas de alguma forma o Rebe entendia que essa linha de investigação estava para conseguir soluções mais construtivas.

Numa carta para mim datada a 5 de maio de 1969, ele abordou o assunto em detalhes:

Geralmente fico relutante em expressar uma opinião sobre assuntos que estão fora da minha área de competência. Porém, tendo olhado através do detalhado programa de pesquisa que você incluiu em sua carta, decidi fazer uma observação:

Não consigo encontrar entre os itens de estudo citados um aspecto que, na minha humilde opinião, deveria ser de particular interesse. Estou me referindo ao reconhecimento de que certos micróbios e infecções podem ser pertinentes a hospitais – uma visão que, acredito, tem recebido alguma atenção na literatura pertinente… Portanto é muito possível que métodos de controle de infecção que são eficazes em qualquer lugar podem perder sua efetividade… porque o ambiente do hospital tem produzido alguns caminhos em certas bactérias que tem dado a elas uma certa imunidade naquele ambiente específico.

Eu não sei se a omissão desse aspecto de seu projeto se deve à circunstância de que um período de três meses de estudo não seria suficiente para incluir uma investigação nessa área, pois, sem dúvida , isso iria criar o problema de distinguir bactérias “imunizadas” de “não imunizadas”, etc., bem como problemas de mudar métodos de esterilização e controle de infecção, e observação clínica, etc. Ou, simplesmente, porque essa questão está fora do seu trabalho atual. Porém, parece-me que essa é uma questão de importância prática…

A direção que ele estava advogando tem desde então se tornado o ponto alto na ciência. Se você olhar para a lista de Prêmios Nobel entregues pelas recentes descobertas na medicina e na fisiologia, verá que o campo dominante é a biologia molecular, o que nos ajuda a entender a resistência ao antibiótico.

Quarenta anos atrás, o Rebe sabia disso! Ele me disse: “Velvl, se você me perguntar, seria mais frutífero entrar neste campo…”

Ele deu este conselho tão modestamente. Ele disse: “Você é o especialista. Não entendo deste campo… Provavelmente estou errado…” Mas ele estava totalmente certo.

Embora eu não seguisse seu conselho, a longo prazo, não posso deixar de ficar impressionado pela visão do Rebe. Ele não tinha qualificações em bacteriologia ou biologia molecular mas antecipou – por quatro décadas – esses desenvolvimentos na ciência moderna. Ele foi mais notável que a vida naquele respeito. Isso na verdade me traz arrepios na espinha. Eu penso agora – talvez eu deveria ter feito o que ele aconselhou.

De volta então, o Rebe deu-me uma bênção para o sucesso em meu trabalho, e fui para a Inglaterra e aprendi muito. Resolvemos algumas das epidemias, mas não encontramos a resposta para a pergunta básica que o Rebe tinha feito.