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De companhia

Fundador de Navegos reflete sobre estar solteiro ou casado e revela o que a sua avó pensava acerca desta questão.

*Franklin Jorge

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como decorrência de minhas observações no curso da existência, conclui que o casamento é uma comodidade que acaba incomodando. Imaginem, por exemplo, ter de dividir a cama e o banheiro com outrem ou acomodar-se a uma tal contingencia que para muitos nada ou pouco significa, embora, para outros, seja o xis da questão.

Durante grande parte de minha vida quis ser só e jamais tive ressentimento disso. Dispor de um espaço só meu, sem atropelos, tendo apenas alguém para mantê-lo limpo e em ordem, parecia-me ser a melhor das aspirações, em especial para mim que colocava o ato de escrever acima de quaisquer outros interesses.

Minha avó, contudo, preocupava-se bastante com essa minha maneira de encarar a vida libertariamente, de ser eu mesmo, apesar das circunstâncias, antevendo o dia em que eu pudesse sentir a falta de uma companhia, sobretudo na velhice, questão que a assoberbou até os seus últimos dias em um apartamento de hospital, a ponto de condescender que a companhia não significava, a priori, feminina, o que me deixou um tanto surpreso e, por que não dizer, ligeiramente escandalizado. Logo eu que não tenho o hábito de me escandalizar com nada.

Baudelaire, um de me meus mestres, não se casou e Borges o fez já em seus últimos anos de vida. Baudelaire, radical nessa questão, dispensava até a necessidade de ter pai e mãe, posto que o artista surge de sua própria obra sem o concurso de terceiros.

A vida de solteiro é boa, mas tem seus inconvenientes – como o casamento. E, fatalmente, prazo de validade. Envelhecer sozinho constitui um desafio, uma prova talvez de fogo. Talvez por isso a sabença popular afirme que antes mal acompanhado do que só.