*Alexsandro Alves
Mesmo que Machado de Assis tenha nos alertado Deus te livre, leitor, de uma ideia fixa!, eu considero uma das coisas mais interessantes descobrir e tentar encontrar alguma variante de ideias fixas nas obras de arte.
Até Machado tinha as suas, por exemplo, o desencanto com o mundo: os seus grandes momentos residem em personagens que sentem e observam o mundo com admirável e filosófica tristeza.
O famoso motivo do Destino, da Quinta Sinfonia, de Beethoven, pode ser ouvido em outras obras.
Literatura, música, a pintura também não está isenta.
O pintor norueguês Edvard Münch, famoso por seus intensos estados melancólicos, é desses artistas.
Como um mal psíquico crônico, Münch repete em muitos de seus quadros os mesmos temas, por vezes mudando apenas as cores ou o ângulo.
É notável sua predileção pela xilogravura, técnica que alcança novos caminhos exatamente com a arte de Münch.
Por que escolheu a xilogravura?
Talvez por sua condição neurastênica, quem o saberá? O fato é que através dessa técnica podia reproduzir infinitamente os mesmos temas, em um processo mais rápido do que através da pintura.
Sua obsessão, que o levou à perfeição e a tornar-se um dos nomes centrais do expressionismo, o fez criar muitos personagens, que aparecem em várias telas e xilogravuras.
Um exemplo é o Ciúme. Trata-se de um rosto masculino que olha fixo para o nada enquanto uma cena qualquer ocorre atrás dele, geralmente envolvendo algum casal. Há dezenas de telas com o personagem, que cobrem os mais variados períodos da vida do artista, abaixo, alguns exemplos.
Uma situação corriqueira, trivial, mas a colocação desse estranho rosto à direita nos leva a imaginar que diálogos se passam entre os personagens, e o ciúme, em qual dos dois está? Talvez na mulher. Há essa figura com caraterísticas masculinas e femininas na parede, com uma espada, o que dificulta mais a precisão de uma definição sobre o assunto.
A expressão do Ciúme, no quadro homônimo não parece ser pessoal. Isso é estranho e por que o personagem sentiria ciúme de uma prostituta? Somos levados a ver a personagem feminina dessa forma pelos elementos de composição do quadro: uma área livre, afastada, com muitas árvores, uma área escondida onde uma mulher, despida, conversa com um homem em uma esquina ou em embaixo de uma árvore.
Na tela de 1907, outro tema constante em Münch, além do personagem Ciúme, é a solidão nas faces humanas, sobretudo nas faces masculinas. Não é perturbador? Com tão poucos elementos o artista rasga os conflitos de forma nada sutil. Münch consegue comunicar muito com tão pouco.
Tanto a tela acima quanto a anterior, de 1907, apresentam o mesmo triângulo de personagens, em uma situação idêntica: o Ciúme, sempre olhando fixo para a frente, um personagem masculino triste e uma personagem feminina, dessa vez, de olhar forte. Um detalhe importante é que na tela de 1907, a mulher passa a mão pelos cabelos. Na de 1896, os cabelos da mulher, soltos, enredam como serpentes o desprotegido rapaz.