*Alexsandro Soares Alves
O amor que o português dedica aos seus doces casa-se com o amor que dedica aos santos.
Esse tipo de culinária, em Portugal, está ligada, de várias formas, à vida nos conventos. As moças que nasciam após a mais velha, e cujos pais não possuíam dinheiro suficiente para seus dotes, eram abrigadas em conventos. Lá, além de uma vida voltada às rezas e ao claustro, também experimentavam sensações mais sensuais, que corporificavam nas sobremesas.
Muitos doces portugueses foram criados por essas mulheres. Estas freiras, que nunca esqueceriam a possibilidade de uma vida mais comum, aja vista os nomes que davam aos doces: sonhos, beijos, amores, também seriam uma das principais molas econômicas em tempos de crise. Elas adaptavam suas receitas requintadas, cortando ingredientes ou substituindo-os por materiais mais baratos, e as vendiam em feiras livres, possibilitando que a economia de sua região permanecesse em pé, ao mesmo tempo em que mantinham o convento.
Que amarga realidade, o sofrimento transformado em doçura. Porém, só mesmo quem nunca sentiu o amor carnal, pode imaginá-lo tão doce e delicado. Estas mulheres, que não nasceram com vocação religiosa, que entraram para a vida conventual por razões econômicas, sublimaram seus êxtases não consumados em sobremesas muito açucaradas.
Muito açúcar, muita gema e muita amêndoa: aqui no Brasil, como resquício dessas freiras nostálgicas, essa mistura surge com o sugestivo nome de baba de moça.
No Brasil, essas doces saudades da carne ganhariam novas cores e ornamentos. Através das frutas tropicais da colônia, se descobririam novas receitas e as receitas tradicionais ganhariam em cor e em estímulos visuais, complementando e dando secreto testemunho dos desejos que se guardavam na clausura. O Brasil tornou mais luxuriante as doçuras amargas do convento.