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Em direção à padaria da esquina

O cronista Abraão Gustavo relata sua tranquila felicidade com um dos mais triviais hábitos humanos. E assim temos a certeza de que a felicidade maior sempre se acomoda nas coisas pequenas.

*Abraão Gustavo

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Acordar cedo, enquanto a cidade ainda se espreguiça e o sol começa a despontar no horizonte, é como dar um mergulho revigorante em um mar de tranquilidade. Sou daquelas pessoas que apreciam os momentos matinais, a calmaria que antecede a agitação do dia. E em meio a essa rotina acelerada, percebi que sentia falta de um pequeno prazer que, por um tempo, ficou adormecido: a ida à padaria para ler o jornal.

Lembro-me das manhãs em que eu me levantava com a disposição de quem tem um compromisso com a própria felicidade. Tomava um banho rápido, vestia uma roupa confortável, e lá estava eu, caminhando pelas ruas ainda adormecidas em direção à padaria da esquina. As lembranças se misturam às sensações, e consigo sentir o cheiro do café recém-feito, das fornadas de pães fresquinhos, que pareciam dançar em perfeita sintonia com o aroma das conversas matinais.

Ao adentrar o estabelecimento, era como se eu entrasse em um mundo paralelo, um refúgio da correria do cotidiano. Os atendentes, já conhecidos pelo nome, sorriam e me cumprimentavam com um caloroso “bom dia”. Era uma atmosfera familiar, onde cada pessoa encontrava seu lugar à mesa, seu pequeno momento de escapismo. Pegava meu café, entregava ao atendente meu bilhete de compra e, com cuidado, escolhia um dos exemplares do jornal local que repousava em uma pilha sobre o balcão.

Encontrava uma mesa vaga, minha mesa, e me acomodava confortavelmente. Ao abrir o jornal, sentia um misto de curiosidade e expectativa. As manchetes já não eram surpreendentes, mas a rotina mundana ganhava um colorido diferente quando acompanhada das páginas impressas. Lia as notícias, mergulhava nos artigos de opinião e me sentia conectado com o mundo, mesmo que por breves momentos.

No entanto, não era apenas o conteúdo das notícias que me atraía, era o ambiente em si. As risadas abafadas, os cochichos desavisados, as conversas sobre política, futebol, novidades locais. Era um verdadeiro palco das histórias da vida, onde personagens anônimos compartilhavam suas experiências e opiniões em um caderno aberto de memórias compartilhadas.

E assim, entre uma xícara de café e uma mordida no pão macio, eu me achava presente naquele universo. Um espectador atento, absorvendo cada palavra escrita e cada entonação de voz das pessoas que ali estavam. Era um momento só meu, e ao mesmo tempo, uma conexão indireta com aqueles ao meu redor.

No entanto, o tempo passou, e a vida seguiu seu curso frenético. Compromissos, urgências, obrigações. A ida à padaria, o jornal, a leitura tranquila, tudo isso tornou-se um hábito esquecido, uma lembrança nostálgica que me traz saudade. No entanto, guardar saudades é também um lembrete de que há momentos especiais que merecem ser revividos.

Quem sabe um dia, em um futuro próximo, eu possa retornar a essa rotina matinal que me trazia tanto prazer. Voltar a acordar cedo, caminhar pelas ruas adormecidas, adentrar naquela padaria acolhedora. Abraçar o jornal nas mãos, sentar em minha mesa cativa e mergulhar no universo das palavras impressas, enquanto o aroma do café paira no ar e as histórias se entrelaçam ao meu redor.

Por enquanto, guardo essa saudade com carinho, presenteando-me com pequenas pinceladas de esperança. A vida é cíclica, e quem sabe um dia, em breve, eu possa reviver esse prazer matinal e reencontrar o toque mágico daquela padaria cheia de vida, histórias e sabores inesquecíveis.