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Esperança e decepção

Fundador de Navegos expõe governos de fachada que usaram artistas locais como cabos eleitorais e puniram duramente dissidentes insatisfeitos com praticas aberrantes.

*Franklin Jorge

A partir da segunda metade dos anos de 1980, desiludi-me de um longo e aprimorado projeto a que me devotara, desde moço, no sentido de promover uma revolução cultural no Rio Grande do Norte. Para isto me preparei, ou seja, procurei assessorar-me de pessoas mais inteligentes e preparadas, que me pudessem enriquecer com experiência e conhecimento à serviço de um projeto de valorização e difusão dos nossos talentos.

Ideara até então uma rede colaborativa da qual resultou, num primeiro momento, a criação e instalação da Oficina de Gravura Rossini Quintas Perez e, posteriormente, quando percebi que esse projeto se tornaria inviável, empenhei-me na criação e instalação da Pinacoteca do Estado, em prédio onde por muito tempo funcionara um comando militar. No transcurso dos 40 anos de criação da Fundação José Augusto, sob a gestão irresponsável e turbulenta do procurador François Silvestre, intentaram publicar um apressado registro editorial da efeméride, mas esqueceram de citar-me, o que aliás só confirmou o que tenho escrito, há quase 50 anos, contra essa instituição que seria perniciosa se pudesse, de fato, atuar na Cultura dita Oficial. Na verdade, como instituição, é só um cabide de empregos desprovido de recursos para tornar a cultura potiguar relevante. Não influi nem contribui, antes dá subempregos e nenhum futuro.

Após voltar da Amazônia, em 1993, deparei-me num restaurante com o prefeito Carlos Eduardo, que alguém já me alertara seria o futuro do Rio Grande do Norte.  Um político que se propunha fazer história, como o jornalista e escritor Carlos Lacerda, homem a um tempo de ação e de ideias, como político e  grande intelectual que era, sempre cercado de gente de mérito e talento. Um político astuto e profundo conhecedor da alma humana, a cercar-se gente notável, dentre os quais citaria dois queridos amigos e mestres que já se foram, os grandes escritores Antônio Carlos, autor de O nariz do morto, e Ascendino Leite, autor do jornal literário mais importante em língua portuguesa. Ao primeiro, além do convívio, delegou a organização de seus papéis e de sua obra-prima, Cão negro. Ao segundo, entregou-lhe a comunicação de seu governo e, ao sair, presenteou-o com um rico Cartório no Centro do Rio, para que ele pudesse continuar a escrever sem sobressaltos materiais. Uma tríade de mestres e visionários.

Fiquei entusiasmado de saber que tínhamos aqui um político que teria Carlos Lacerda como referência, no entanto, que a informação pudesse estar não inteiramente correta, a considerar que como padrão intelectual Carlos Eduardo está muito aquém de seu ídolo. Quando prefeito de Natal em vários mandatos, usou alguém sem cultura e nenhuma distinção intelectual, além do que invejoso, rancoroso e perseguidor de artistas, a própria negação da cultura, que é em essência generosa e colaborativa. Desconfiei que a nossa cultura pudesse avançar sob o tacão de gestor tão medíocre e infame perseguidor de artistas, o secretário de entretenimentos de Natal.

Pensava que a Sala Natal, para a qual o prefeito Carlos Eduardo nomeou-me diretor, pudesse ser a vertente cosmopolita da cultural oficial, um instrumento capaz de urdir políticas em favor da nossa cultura, ao torna-la exponencial no conjunto da Federação. Talvez o erro esteja incrustado na hierarquia administrativa; a Sala Natal devia ter surgido diretamente ligado ao Gabinete do Prefeito, não ao do secretário incapaz de pensar a cultura como algo importante e complexo.

Assim, posso afirmar que reuni, em Carlos Eduardo, a um tempo, esperança e decepção. Pensei que ele pudesse dar o salto necessário em favor da nossa cultura, há muito esperado, por nossa cidade, que tem artistas de mérito que vivem no ostracismo. A cultura de uma cidade com vocação cosmopolita, que continua dançando pastoris precários, a bel-prazer de figurinhas carimbadas, como Isaura Rosado e Lacrau Jr. Exemplos de mediocridades triunfantes.

Franklin Jorge, é escritor, Jornalista e Editor da revista Navegos.

Parceria maligna contra a Cultura natalense dura há duas décadas de humilhação e agustia para artistas conservadores.