*Alexsandro Alves
O YouTube tem me feito retornar muito no tempo. Muito. E isso já se transformou numa expectativa.
Antes de ontem, foi a vez dele me lembrar do disco Brilhante – Internacional. Foi uma novela exibida pela Rede Globo em 1981, eu tinha então 6 anos.
Eu nem me lembro da novela, de sua trama. Mas da música, sim. Nós tínhamos esse lp.
Minha mãe não costumava ouvir muita música estrangeira, porém ela ouvia esse lp. Sobretudo a terceira música da lado A: Hurt, cantada por Carly Simon. Era a cara dela.
As músicas que eu ouvia, apreciando, desse disco, eram: Comin’ in and out of your life, cantada por Barbra Streisend; Hurt; Murmures, de Richard Clayderman; You weren’t in love, por Mick Fleetwood; Little Darling, por Sheila. Mas todas as outras eram muito boas também.
Hurt era especial porque era a que minha mãe cantava, e cantava mesmo. Uma casa sem música não é um lar. E mamãe transformava nossa casa sempre em nosso lar.
Ela chegava do culto, da Assembleia de Deus (nessa época ela era evangélica, mas o evangelismo de minha mãe nunca a impediu de ser uma mulher deslumbrante), e ligava o 3 em 1, da National. Tão jovem, tinha 26 anos. Ligava o som, e quando era a trilha sonora da novela, eu já sabia que, na terceira música eu a ouviria, a plenos pulmões, com muita vontade: Hurt to think that you lied to me, como isso era mágico, ouvi-la cantar, tinha um grande efeito. Eu não sei se ela cantava corretamente. Mas a emoção e o show eram sinceros. Essa música tem um apelo meio musical da Broadway, tanto na interpretação quanto nos arranjos – e mesmo de sofrimento amoroso também. E os seus vestidos longos, de crente, com os seus cabelos negros lindos, longos e caídos até a cintura, eram, para mim, o fascínio que relaxava e preenchia de alegria o lar, a mise en scène de um musical diário e repetitivo que sempre era novo e renovado a cada repetição.
Às vezes, eu também participava, porém eu gostava mesmo de assistir.
Se bem que, minha participação era apenas isso: ela me pegava nos braços e cantava mais próximo de meu rosto e girava, comigo em seus braços e seus cabelos de índia soltos, dançando, que ela jogava ainda mais, fazendo-os cair em meu rosto. Ela gostava muito de dançar Angelica and Ramone, e sempre me puxava! Era divertido, mas era chato. Porque dançando eu não podia apreciá-la.
As canções de Barbra e Fleetwood, ouvindo hoje, se confirmam, juntamente com a de Carly, as mais bonitas desse disco. Apenas a música pode trazer de volta os bons momentos, estão lá, em pentagramas do tempo, aguardando o momento de surgirem, como leitmotive, de nosso drama musical interior.