*Gustavo Abrahão
Semana passada fui para São Paulo rever minha família, claro, de avião. Como dizia Chico Buarque de Holanda, o que era sofisticado, hoje dia, já virou brega. Passagens caras, voos superlotados, cadeiras milimetricamente colocadas dentro dessa gerigonça pregada com arrebites.
Falar que viajou de avião já não é mais interessante como no início dos anos oitenta. Atualmente, viajar de avião é sinônimo de um passeio desconfortável e perigoso. Crianças chorando, pessoas com bagagens de mão disputando lugares, se você der sorte de e se sentar no corredor vai conseguir ir ao banheiro sem incomodar ninguém, mas também vai passar a viagem toda sem dormir.
Caso sente perto da janela e tenha vontade de ir ao banheiro e todos estiverem dormindo, você está lascado. Se sentar na frente nas fileiras entre 1 e 9, você pode sentir o avião balançar menos. Se sentar próximo à calda, aí você vai ver o que é bom para tosse. Na calda do avião você sempre encontrará cristãos fervorosos, católicos praticantes e novos pecadores arrependidos.
Sentei-me no meio do avião, próximo à janela, então tive a visão panorâmica entre o céu e o inferno, entre Flamengo e Fluminense, entre Deus e o Diabo. A cada tremida, a cada curva, católicos com seus terços rezavam baixinho e faziam o sinal da cruz, outros dormiam como pedras, outros peidavam e roncavam ao mesmo tempo.
Nunca consegui fazer isso. Tinha um homem do meu lado que, creio eu, estava com alguma disfunção diurética, pois não parava de ir ao banheiro. Enquanto eu tentava tirar o chiclete grudado na cadeira da frente com uma chave, ouvi os otimistas comentando:
– O avião é velho, mas o piloto é experiente.