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Não foi por falta de aviso

“Nossa história pessoal, começa antes de nós existirmos. Ela é a história de nossos pais e dos pais dos nossos pais, e assim regressivamente. Ela é a história do lugar onde nascemos e por isso, os nomes de nossos pais e desse lugar estão em nossos documentos para sempre.”

*Percival Puggina

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Nossa história pessoal, começa antes de nós existirmos. Ela é a história de nossos pais e dos pais dos nossos pais, e assim regressivamente. Ela é a história do lugar onde nascemos e por isso, os nomes de nossos pais e desse lugar estão em nossos documentos para sempre.

“Existe um modo de fazer a história e um modo de contar a História” (Betinho). A meu ver, a melhor maneira de fugir das simples narrativas, tantas vezes desenvolvidas por filósofos e historiadores comunistas, é ir atrás das raízes mais remotas dos fatos, percorrendo suas linhas de continuidade e suas rupturas. Evita-se, assim, a interveniência dos seguidores de Karl Marx, filósofo que, nas próprias palavras, não veio “para interpretar o mundo, mas para transformá-lo”. O modo de contar a história se presta admiravelmente para isso.

“Somos tão poucos, e Portugal é tão pequenino!”. Esta frase tantas e tantas vezes proferida é um diagnóstico realista sobre o condado que D. Afonso Henriques, no ano de 1139, transformou em seu pequeno reino. O pai do Fundador, Henrique de Borgonha o recebera como presente de casamento do sogro, D. Afonso VI de Leão.

Impossível, para mim, imaginar que a história do Brasil comece a ser contada a partir do dia 22 de abril de 1500, ou do dia 9 de março daquele ano, quando a Praia do Restelo acumulava multidão formada pela numerosa tripulação das 13 naus, 1,5 mil homens, seus familiares, o Príncipe Perfeito (D. João II), sua Corte e parte expressiva da população de Lisboa, estimada, à época, em 50 mil habitantes.

O Brasil não foi um achado. Foi buscado. E quem o buscou, sabendo em que direção navegar, foi levado pelas mãos do Senhor da História.

Os experientes navegadores portugueses sob comando de Cabral eram peritos no uso dos GPS da época. A bússola, a balestilha e o astrolábio de Abrahão Zacuto. Tanto sabiam onde estavam e como chegar ao seu destino que, nos primeiros dias de maio, deixaram Porto Seguro, cruzaram o Oceano Atlântico e contornaram o Cabo da Boa Esperança.

O que nos veio de Portugal é muito mais do que a posse da terra, a civilização e o povoamento deste continente chamado Brasil. É algo que nos liga acima de qualquer outro fator de unidade. São os longos fios com que se foi tecendo e bordando a história da nossa fé e do nosso idioma. Eles nos conectam com lusófonos e cristãos mundo afora!

Com a chegada das legiões à Península Ibérica, veio o latim; com a conversão de Constantino, o cristianismo se tornou religião do Império. Um século e meio depois, os bárbaros cruzaram o Reno. Quando suevos e visigodos entraram na Península Ibérica, o idioma deles misturou-se com o latim vulgar, dando origem ao nosso idioma e ao espanhol. Com eles, também chegou o arianismo, superado pela obra evangelizadora de extraordinários bispos e santos medievais.

O Descobrimento do Brasil é ponto culminante de um projeto político viabilizado pela criação da Ordem de Cristo, a qual, entendendo a posição geográfica do país na Europa, sua reduzida população e seu pequeno e montanhoso território encontrou no mar o seu destino e abriu suas velas aos ventos e a História Universal em novos caminhos. As Grandes Navegações persistem até estes dias como a maior aventura da humanidade. Delas, o Brasil é imensa realização.

Os seguidores daquele filósofo que veio transformar o mundo, o “messias” alemão, filho de dona Henriette, não pensam assim. Para eles, os portugueses fizeram tudo errado pois deveriam ter ficado em Portugal guerreando com os espanhóis, como faziam antes, em vez de andarem pelo mundo descobrindo mares e terras, levando a cruz da Ordem de Cristo nas velas e no peito. Para eles, todos, exceto eles mesmos, são invasores de um paraíso dissipado pelo maldito direito de propriedade.

Ideologicamente, é uma tese perfeita. Anti-histórica, mas quem se importa com isso se dá para armar uma bela confusão? Se viabiliza animosidades e conflitos sem os quais sua militância perde o gás? Se perturba os “fascistas” do agronegócio? Se reforça a atividade dos companheiros das ONGs que atuam na Amazônia brasileira? Se desestabiliza o famigerado direito à propriedade privada (dos outros)? Se vai criar gigantescas e incalculáveis contas fiscais por prazo infinito? Se vai restituir terras produtivas à inatividade dos nativos? Se reforça todos os itens da pauta identitária que precisa, como do ar que respiram seus militantes, da ideia de uma conta a receber? Se é isso que o companheiro Lula quer?

Saibam todos: não foi por falta de aviso.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.