*Francisco Alexsandro Soares Alves
O amor é um pássaro rebelde, assim Carmen inicia uma das mais famosas árias da ópera… A Habanera! Em sua Nova História da Música, Otto Maria Carpeaux, afirma que esta ária nada tem de espanhola, é toda francesa. Uma afirmação que contém uma mentira e uma verdade. De fato, esta ária francesa nada tem de espanhola, mas muito menos de francesa. Bizet a inseriu em um texto que o próprio escreveu para sua ópera mais famosa – e sua obra-prima. De francesa só tem mesmo a língua. Mas se a famosa ária não é de origem espanhola ou francesa, qual sua origem?
Na verdade, o que muitos desconhecem, é que a melodia dessa ária nem mesmo é de Bizet! Trata-se de uma composição do espanhol Sebastián Iradier (1809-1865) chamada El arreglito, do catalão, O conserto. Iradier a compôs por volta de 1860 e a publicou em 1863 juntamente com outras canções nesse ritmo, a mais famosa, juntamente com o El arreglito é La paloma, eternizada no canto de muitos cantores populares no século XX, como Júlio Iglesias. Iradier morreu na obscuridade, esquecido. Suas habaneras no entanto lhe garantiram projeção depois de sua morte. Mas não sem erros e confusões. A maior delas é esta, protagonizada por Bizet.
É certo que após descobrir o erro, o francês fez uma nota em sua partitura onde reconhece a composição com sendo do espanhol, e ainda escreveu que usou a melodia por pensar que era um tema folclórico. A historiografia o desmente, porque estas habaneras foram todas publicadas em Paris como sendo compostas por Iradier e não em volumes de músicas folclóricas, como era costume para esse tipo de música.
Mas voltamos a questão: qual a origem da habanera, se não é espanhola, muito menos francesa? Alguns a consideram um tango. Erram. São dois ritmos diferentes e o tango é argentino, a habanera, de novo, não tem origem nesse país.
Mas é do continente! Sim, o ritmo que o francês eternizou em nada é europeu. Na década de 50, Iradier, ansioso por novos ritmos, embarca para Cuba, e lá conhece a contradanza – que ao trazer para a Espanha se torna conhecida por habanera – a dança de Havana. É dessa viagem que seu livro de habaneras surge. E conquistou os salões e o gosto de muitos franceses, além de Bizet: Ravel, Chabrier, Massenet, Saint-Saëns, foram para Cuba dançar a contradanza em muitas de suas composições.
No You tube, no endereço https://www.youtube.com/watch?v=YFDurZPYTDU, encontra-se a habanera original que Bizet plagiou em Carmen, esta pode ser encontrada aos borbotões no site. O que mais me causa apreensão é o esquecimento de musicólogos sobre o assunto. Até mesmo o Kobbé, o livro mais completo de ópera, não menciona o plágio. Mas agora, ao ouvirmos Carmen cantar sobre o pássaro rebelde que é o amor, coloquemos nossos pés em Havanax