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Nós Te Amamos, Zé Celso! (Editorial, 06/07/23)

Bem-vindos à edição de hoje, 06 de julho de 2023, de Navegos, sua revista eletrônica independente, a serviço da informação descentralizada, da crítica e do entretenimento. Boas leituras!

*Da Redação

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Uma notícia triste abateu o país hoje. Soubemos da morte de José Celso Martinez Corrêa, dramaturgo criador do Grupo Oficina. Nasceu em Araraquara, em 30 de março de 1937 e faleceu hoje, em São Paulo, cidade que adotou como sua terra artística, seu lugar para criar brincadeiras que maravilhavam muitos e escandalizavam outros tantos.

Tão polêmico e genial quanto o carioca Gerald Thomas, Zé Celso, como ficou conhecido entre os que aqui choram sua ausência, foi sempre um inovador que procurava se distanciar dos modelos de encenação europeias e criar a partir do Brasil. Embora que numa relação antropofágica, porque se servia, e em doses cavalares, do teatro da crueldade, de Artaud.

É dele a primeira encenação de “O Rei da Vela”, peça satírica de Oswald de Andrade escrita em 1937 e encenada postumamente em 1967. Uma vez escrita, Oswald nunca conseguiu encená-la, os motivos foram muitos: mas o principal deles era que a obra não tinha sentido.

O que faltava era a visão anárquica de Zé Celso em uma obra que “chuta o balde” da visão econômica liberal a partir de um estranho relacionamento amoroso, insurgindo-se contra as relações de poder capitalistas e a subserviência brasileira, tendo como pano de fundo o Estado Novo de Getúlio Vargas. Uma obra que, a partir do modernismo de 22, desembocava na futura estética tropicalista. É nessa antropofagia de colagens estéticas que Oswald escreve sua mais eloquente obra, sua obra-prima – no fim, era um homem de teatro e não da poesia.

E Zé Celso botou para fora toda a força e agressividade contidas no texto de Oswald, assumindo, inclusive, que a obra tem final aberto, sem explicações.

Em 2015, em meio às desordens políticas no governo da presidente Dilma Rousseff, o Oficina encena “Para dar fim ao juízo de deus”, de Artaud, em um momento de radicalismo político e fundamentalismo religioso. As críticas que explodiram nas redes sociais não disfarçavam, na verdade, o ódio vingativo e reacionário contra uma encenação definida por Zé Celso como “um corpo a corpo”.

Lembramos de um especial exibido na TV Cultura nos anos 90 em que Zé Celso, dançando no palco do Teatro Oficina, dizia: “o paulistano não entende essas coisas, o paulistano não entende não essas coisas”. Ninguém entende. O teatro, quando demonstra todo seu poder humano, rasga a sociedade ao meio. E Zé Celso será sempre essa ruptura, viveu como vulcão sempre ativo, e deixa lavas incandescentes a nossa volta em sua última erupção.

Descanse em paz.

Nessa edição de Navegos, os colunistas e seções (clique no nome para ir direto ao artigo): Nadja Lira, José Vanilson Julião, Leandro Ruschel e Calle del Orco. Desfrutem.

 

O dramaturgo