*Alexsandro Soares Alves
Em justa homenagem à memória do performático Pedro Grilo, acaba de sair pela OffSet Gráfica o livro Borratela de Natal – Pedro Grilo Neto, que contém reproduções de pinturas de Grilo, falecido em 22 de abril de 2022, ao lado de trovas, gênero literário apreciado por Grilo.
Pedro Grilo Neto é natural de Goianinha/RN, mas pintou sua vida, enquanto personagem de nossa cultura, na cidade de Natal. Poeta, trovador, cantor e pintor, sua figura era inconfundível: sempre muito bem-vestido, de linho branco, com seu imenso chapéu de palha e seu cajado, perambulava pelas ruas natalenses se misturando e ao mesmo tempo se diferenciando do povo comum. Homem de gosto refinado, amava a poesia metrificada, clássica e a trova, além de ser barítono e um amante da ópera.
É personagem também do Spleen de Natal, obra mestra de Franklin Jorge, que com sua elegante e nobre prosa, eternizou em suas páginas a personagem de Grilo. Grilo e Franklin fazem parte de uma Natal mais artística, modernista e genial.
Eu não tive a honra de conhecer Grilo. Vi-o algumas vezes em andanças pelo Centro da cidade. A primeira vez que o vi foi exatamente recitando um poema, em um 14 de março de 1998 e a partir daí sempre imaginava “quem é esse homem”? E quando o via pelas ruas do Centro, o desejo era de falar-lhe e agradecer-lhe pela poesia que ouvi. Por vários motivos, dentre eles a pressa daqueles momentos, nunca o fiz. E passaram-se anos, 24 anos! Se nunca o conheci, se nunca travei com o trovador conversas, quis o Destino reservar-me um lance poético, desses lances de dados que o Destino vai arranjando silenciosamente e se transfiguram em encantamento quando se completam.
Horas antes de sua morte, recebo mensagens de WhatsApp, de Adélia Costa, presidente da SPVA. Assim como Grilo, também nutro profundo relacionamento íntimo com a ópera, e Adélia pede-me gravações de ópera para embalar aqueles instantes de Grilo, que não sabíamos serem seus últimos. Envio-lhe uma gravação do Cravo bem temperado, de Bach. Por estar naquele momento em um hospital, decidi lhe mandar música barroca para cravo, mais suave e contemplativa do que os arroubos operísticos. Porém Adélia, que cuidou dele em seus últimos meses de vida, e sou testemunha de sua devoção, me manda logo outra mensagem: “É ópera!”. Então lhe mando um vídeo com seis horas de canto operístico. E Adélia me diz que ele está tranquilo. E assim, se não o conheci, exatamente nas últimas horas de vida do Borratela de Natal, nossas vidas se uniram através da ópera! Mais encantamento e poesia impossível!
Apenas o Destino escreve assim. Agora, Pedro Grilo Neto descansa. Longa vida ao Borratela de Natal.
