*Abraão Gustavo
Hoje acordei decidido: ia tomar um café. Mas não qualquer café—um daqueles de padaria, no copo americano, que vem forte e preto como a alma de segunda-feira.
Entrei no estabelecimento animado e pedi um pingado e um pão na chapa. O balconista, um sujeito magro de bigode ralo, hesitou.
— O senhor quer mesmo?
Estranhei a pergunta.
— Ué, por quê?
Ele olhou para os lados, abaixou o tom e cochichou:
— O café subiu.
— Subiu quanto?
— Bom… O senhor quer saber o preço do dia ou da última hora?
Achei que ele estivesse brincando, até notar que um homem na mesa ao lado segurava uma xícara vazia e apenas a cheirava, com os olhos marejados. Outro cliente pagava o café em três vezes no cartão.
— Mas e aquele café do bule, que ficava de graça no balcão?
Ele suspirou, pesaroso.
— Foi confiscado pela Receita Federal.
Nesse momento, um sujeito entrou correndo e perguntou, ofegante:
— Chegou café do Paraguai?
O padeiro fez que não com a cabeça. O homem soltou um palavrão e saiu batendo a porta.
Desisti do café e pedi um leite.
— O senhor quer puro ou parcelado?
Agradeci e fui embora. Do lado de fora, um grupo discutia as cotações da bolsa de valores.
— E o café? — perguntou um deles.
— Subiu mais que o barril de petróleo! — exclamou outro.
Fiquei ali, parado, olhando para o horizonte. O café agora era artigo de luxo. E eu, um mero ex-bebedor, sem condições de sustentar o vício.
No caminho de casa, parei no mercado e fui direto à prateleira de chás. Era isso. O jeito era mudar de hábitos. Peguei um pacotinho de camomila e fui para o caixa.
— Vai querer parcelar?
Deixei o chá e fui embora.