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O curandeiro virou coaching

Mestre em Direito faz dura crítica a mais um modismo de espertos que enriquecem com a fraqueza dos outros

*Honório de Medeiros

Abro a rede social e sou inundado por uma maré de anúncios de “coaching”. E de comentários de “Coachs” e “Coachees”, ou seja, os treinadores e os treinandos. Fico perplexo com o que leio. A propaganda do treinamento é sumamente pretensiosa, o preço, salgadíssimo, e o resultado, bom o resultado é fabuloso para quem ganha dinheiro com isso.

Diz lá a propaganda que o “Coaching” é um “processo que utiliza técnicas, ferramentas e recursos de diversas ciências. Algumas pessoas apregoam que Coaching é ciência, mas na realidade é um coquetel, um mix frágil de recursos e técnicas que funcionam em ciências do comportamento (psicologia, sociologia, neurociências), e de ferramentas de administração de empresas, esportes, gestão de recursos humanos, planejamento estratégico e outros”.

Não pude deixar de me divertir com a pretensão desse pastiche de autoajuda típico da virada do século. Quer dizer que o treinador entende de psicologia, sociologia, neurociência e administração? É um portento, a criatura. Quer dizer que o “coaching”, se não for ciência, é um mix de recursos e técnicas que funcionam em várias áreas do conhecimento?

Diverti-me ainda mais quando li a propaganda de um dos cursos, afirmando que todo homem poderia encontrar, em si, o macho-alfa que ele é. Bastaria querer e fazer aquele “coaching”. Outro pretendia apresentar o treinando a sua verdadeira essência. Verdadeira essência. O que danado é verdadeira essência? Tem essência que não seja verdadeira?

A capacidade de ser iludido é infinita, no ser humano. E o dom de iludir, também, é o que parece. Penso que é inerente à espécie. Só pode ser. Vai ano, vem ano e tudo se repete como farsa. Muda a roupa, mas o corpo é o mesmo.

Na literatura – entendida esta em seu sentido mais lato – o registro da atividade dos “coachs” é muito antigo: tanto aqueles de antigamente, quanto os de hoje, trabalham a partir de um insumo básico: aparentam saber em profundidade algo que não sabem, e mistificam astuciosamente alguns “standards” do senso comum, tal qual faziam e fazem cartomantes, numerólogos, terapeutas holísticos, pregadores, magos da “auto-ajuda”, mentalistas, e tantos outros, em proveito próprio.

Os “coachs” exalam auto-confiança. Andam sempre muito bem “empacotados”, lustrosos, sorriso fácil, simpatia à flor da pele. Querem passar a imagem de vencedores a todo custo. Dominam alguns truques óbvios do mentalismo de salão, tais quais técnicas de memorização, para pegar os incautos. São versados na arte de dizer o óbvio de forma sofisticada. Falam em “atitude quântica”, “mentalidade holística”, “seleção do mais apto”.

Ou seja: aparentam saber, para saber aparentar. Não por acaso os melhores, dentre eles, são verdadeiros artistas da mistificação. Alguns até mesmo fundam seitas…

E então, das pessoas que lhes impressionaram, caro leitor, durante os anos de sua vida, seja em que área seja, qual delas mesmo fez o curso de “coaching”? João Paulo II, talvez? Barak Obama? Stephen Hawking? Pelé? Henry Ford? O último prêmio Nobel de literatura? De medicina?

Acho que o de física, fez.

Honório de Medeiros – Honório de Medeiros, advogado, é mestre em Direito de Estado pela UFCE