Franklin Jorge
Disse Machado de Assis, em Esaú e Jacó, que nada dói mais num vaidoso do que a sensibilidade destituída de talento: sente, mas não sabe expressar esteticamente seus sentimentos. Sempre que essas palavras me vêm à memória, não sei por que, lembro imediatamente de Diógenes da Cunha Lima, que passou a vida inteira cortejando e sendo ignorado pelas Musas, que têm o hábito de não dar confiança a qualquer um! Num vaidoso, então, a frustração se transforma em tormento e dele faz, do vaidoso, um pobre diabo digno de comiseração.
Conhecido entre nossos jovens artistas e intelectuais – que riem de sua triste figura – como “O Lagarto”, e mais recentemente como “Pavão de Galinheiro”, ninguém tem lutado mais no Rio Grande do Norte para parecer o que não é, um intelectual de mérito. Sem dinheiro, seria apenas uma dessas curiosidades ou tipos excêntricos, como os há em toda comunidade de escritores e aspirantes a escritores, sem, contudo, convencer nem mesmo o ledor mais desprevenido e descalçado de cultura. Em resumo, um ser que se vende mais caro do que vale, em meio a uma rafameia de bajuladores desavergonhados, dentre os quais se destaca o vociferante “Cloretinho de Sódio”, apelido impiedosamente pespegado para sempre no jornalista Vicente Serejo por um refinado articulista local, mestre da paródia e do escárnio.
Dizem-no, além de um vaidoso empedernido e destituído de talento, o homem mais rico do estado, como se o dinheiro pudesse abrir-lhe as portas do Parnaso. Tanto isto é verdade que Diógenes se destaca entre nós por ser um poeta de fôlego curto. Como prosador, mantém um conglomerado de ghost-writers e amanuenses de aluguel, dentre os quais se contariam os falecidos Celso da Silveira, Luís Carlos Guimarães, Ney Leandro de Castro, e o professor Protásio Melo, que surpreendi numa certa manhã sobraçando um calhamaço, no escritório de Diógenes, para entregar-lhe o livro que ele estava escrevendo e receber seu pagamento. Um livro, naturalmente, sobre a carcaça do mestre Luís da Câmara Cascudo, seu defunto predileto e inspirador de uma enfieira de livros que não acrescentam uma vírgula ao gênio potiguar.
Como todos aqueles que se acham escritores, o pseudo-exegeta de Cascudo estreou em versos com Lua 4 vezes sol, livro que seria surrealista se ele tivesse sido apresentado alguma vez ao surrealismo. Na verdade, um livreco que não se sustenta de pé, de tão esquálido que é, em forma e conteúdo. Já tentou de tudo sem sucesso: necrófilo de Cascudo e aproveitador de Camões, pois a vaidade, como se sabe, nele é gananciosa e cheia de si.
Desprovido de discernimento e bom senso (seu verdadeiro talento consiste em juntar dinheiro e vestir-se como um tabaréu desenxabido), tem se esforçado inutilmente para ser simpático, algo que jamais conseguiu em seus 90 anos de vida no limbo da literatura, onde sobrepujam os medíocres.
Estreou mal, declarando-se um “menino comedor de corações de rouxinóis”, o que faz dele um poeta antiecológico, ou seja, alguém que se confessa assassino de uma das mais belas criações da natureza. Já um grande e genuíno poeta, como Jorge Luís Borges, em sua grandeza, exalta a inocência dos pássaros e os deixa viver como se fora a própria assinatura de Deus.
Para finalizar, transcrevo, embora faltando um verso de que me esqueci, uma amostra do estro de um poetastro que nos deu o rio Curimataú:
“Se eu fosse o rei da China
E tivesse um burro mongol
[…]
Lua quatro vezes sol”.