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O Direito de Representação

Ex-integrante do Poder Judiciário federal esclarece o direito que todo cidadão tem perante a Constituição e o Código Penal brasileiro de recorrer a ações penais quando se sentir prejudicado, não somente através de violência física, mas também por calúnia e difamação ou igualmente sabedor de atos de corrupção por parte do Poder Público

Edilson Alves de França

Dentre os vários sentidos que o direito empresta ao verbo “representar”, um deles, mais necessariamente, diz respeito ao cidadão. Principalmente àquele que se preocupa com a legalidade e moralidade que devem nortear os atos e ações originários dos Poderes Públicos. Refiro-me àquela representação que viabiliza o direito constitucional de qualquer um de nós se dirigir, pessoalmente, a uma autoridade pública. Seja para informar, revelar, comunicar ou solicitar formalmente determinada providência, essa iniciativa encontra-se plenamente assegurada pelo art. 5º, XXXIV, letra “a” da Constituição da República.

No âmbito criminal, o vigente Estatuto Punitivo trata do instituto da Representação em vários artigos, fazendo constar, inclusive, aqueles casos nos quais a iniciativa do ofendido se faz imprescindível. Por sua vez, o Código de Processo Penal, expressamente, assegura no seu art. 5º, II, que o ofendido, mediante requerimento, pode provocar a autoridade policial com vista à abertura de inquérito, quando se tratar de crime que enseje ação penal pública.

Mais adiante, no seu § 3º, referido artigo dispõe que qualquer pessoa poderá verbalmente ou por escrito comunicar à autoridade policial a existência de infração penal que comporte ação pública. No mesmo artigo, repousa ainda a advertência de que nos crimes em que referida ação depender de representação, o inquérito não poderá sem ela ser iniciado.

A representação penal, em poucas palavras, constitui-se valioso instrumento de participação da sociedade, mais precisamente, no que pertine à apuração e elucidação dos crimes praticados contra a administração pública. Infelizmente, quase sempre silente, acomodada ou entorpecida pela sucessão de fatos que diariamente lhe são dadas a conhecer, a sociedade não tem correspondido à prerrogativa que a lei lhe assegura. É preciso ser dito e repetido que, onde quer que sejam exercidas funções estatais, ocorrendo desvios, abusos ou qualquer que seja a prática ilícita, todos nós (cidadãos, associações, sindicatos ou instituições profissionais) podemos oferecer ou formular representação aos órgãos encarregados de apurar ou de proceder à abertura das respectivas ações penais.

Limitar-se a veicular lamentações, fakes, chistes e provocações políticas, através de blogs ou outros meios de comunicação, parece pouco, muito pouco mesmo. A verdade é que não temos dado ao direito de representação, principalmente contra ilegalidades administrativas ou abusos de poder, a importância que tanto se ressaltou durante os trabalhos da nossa última Assembleia Constituinte. Ali, repita-se, muito se debateu, discutiu e argumentou, buscando ampliar esse direito, de modo a viabilizá-lo por intermédio do oferecimento de petição, reclamação ou representação, formulada individual ou conjuntamente. O fato é que nos foi entregue um instrumento político-fiscalizatório da atuação do Estado, voltado para a defesa da legalidade e do interesse público em geral. Por isso mesmo, não se deve cogitar, como pensam alguns, que para exercer o direito de representação se faz necessário ocorrer uma lesão a interesse do próprio representante.

Acresça-se que, atualmente, o direito de representação, tal como assegurado ao cidadão, constitui-se prerrogativa democrática de caráter essencialmente informal. Tanto é que, em alguns órgãos, esse valioso instrumento pode, inclusive, ser exercitado verbalmente e digitado por um servidor previamente designado. Antes de reforçar a coreografia dos indignados bailarinos políticos, sem incorrer nas conveniências seletivas, represente, faça uso do direito constitucional de representação. Certamente lhe será dado concluir que vale apena contribuir, somar ou ajudar no combate à corrupção.

Edilson Alves de França, procurador regional da República aposentado, ex-subprocurador-geral da República e professor de pós-graduação em direito na UFRN, é autor do livro “Teoria e Prática dos Prazos Eleitorais” (FeedBack; 350 págs.; 2014).

CONSTITUIÇÃO CIDADàMomento em que o Congresso promulga a Constituição de 1988; em vários Artigos, Parágrafos, Incisos e Alíneas, ela garante a todo brasileiro mover ações penais quando se sentir pessoal e coletivamente ultrajado