*Franklin Jorge
Nascida no Encanto em 1963, Franci Fernandes publicou em 1994, numa edição particular o seu primeiro romance – “Não Pergunte ao Vento” –, depois de produzir contos e poesias líricas que marcaram a sua estréia nas letras potiguares. Esta entrevista, feita com o intuito de chamar a atenção dos leitores para uma jovem escritora dotada de excepcional talento, ficou inédita desde então, pois coincidiu com a minha demissão do jornal em que eu trabalhava então e com uma dura ofensiva de pessoas que se escondiam no anonimato para dificultar o meu reingresso no mercado de trabalho. Sem trabalho, perseguido por políticos poderosos, guardei o texto produzido em setembro de 1995, que agora divulgo com a certeza de contribuir para a divulgação de uma escritora que irrompe, no universo literário, como uma força nova e imprevista em meio ao comodismo e ao marasmo de que adoecem as nossas letras. Sinto-me honrado de ter sido dos primeiros a reconhecer o seu talento e a propagar seu mérito. À entrevista.
O que a levou a escrever?
Franci Fernandes – Um desejo incontrolável de poder transformar as coisas, os acontecimentos, as pessoas enfim. É incrível a sensação de poder controlar o destino de cada personagem; sentir, pensar e agir com eles e por eles. Toda essa gama de emoção, tornou-me um ser endeusado, menos impotencial.
Que lições tirou desse aprendizado como romancista?
Franci Fernandes – Como mulher e sonhadora, descobri que sou capaz de viajar o mundo sem sair do lugar, que há um sol dentro da gente impulsionando-nos a cada fracasso, e dessa energia que se renova sempre surgem as nossas novas criações. Toda natureza do nosso mundo interior vibra em torno da arte, e ela vai tomando formas diferentes com o passar dos tempos. Qualquer que seja a sua forma de expressão, a arte é o alimento que nos mantém vivos. Todo artista é um mutante, e o romancista é um dos mais ousados.
O que a fez fugir da tendência, presente nos ficcionistas potiguares, do regionalismo?
Franci Fernandes – Tenho minha própria tendência literária, nunca me prendi a nenhuma escola, muito menos a esse ficcionismo que habitualmente se vê por aqui. Acredito que, se eu me prender a certos modismos, estarei suprimindo as minhas capacidades criadoras. Não se pode pôr limite na arte, muito menos na arte de jogar com as palavras. Que me perdoem os grandes mestres da literatura.
Quais os principais obstáculos que, como artista, tem enfrentado?
Franci Fernandes – Resumo tudo em um só: o descaso. A indiferença com que as pessoas trataram a minha obra doeu na alma, a começar pelos editores que olharam de soslaio e deram de ombros; em seguida, aqueles que podiam ser meus leitores não se deram ao prazer de por algumas horas viaja comigo. Foi difícil até encontrar alguém para prefaciar a minha obra. É como se as pessoas não quisessem se comprometer ou não se sentissem capacitadas. Para mim seria uma honra, mas o que se pode fazer!
De que forma o fato de ter nascido e vivido numa pequena cidade do Alto Oeste se reflete na sua escritura?
Franci Fernandes – Acredito que para mim faltaram chances. Se eu tivesse tido a oportunidade de fazer uma boa Faculdade, contatar diretamente com outros escritores e viajar mais o meu universo intelectual estaria mais enriquecido. Isto é óbvio. Mas o fato de morar numa cidade pequena não me impossibilita de transportar para o papel toda essa beleza que fervilha feito um vulcão aqui dentro. Sei que as minhas asas são maiores do que o meu ninho, e que por isso de vez em quando levanto vôo. Sou como as águias que amam as alturas e é isto que me faz sentir viva. Eu aprendi a driblar o tédio acrescentando mais fermento aos meus sonhos. Aprendi que somos uns ternos aprendizes e que a arte pode ser concebida em qualquer lugar; que ela independe de espaço para nascer, mas precisa de espaço para se propagar, do contrário perderá a sua essência.
Como definiria o ato de escrever?
Franci Fernandes – Aquele que escreve reconstrói o seu mundo interior, porque automaticamente envolve e se envolve por essa magia que funciona como uma terapia. Quer gere heróis, quer gere vilões dentro do seu contexto literário, o escritor se assemelhará sempre ao grande Criador. Será sempre um descobridor, um desbravador de novos mundos… Escrever é a arte de viajar com as palavras em busca de continentes desconhecidos, de lugares agrográficos, de espaços extratemporais… E para essa fantástica viagem o escritor só precisará escorregar do consciente para o mundo das fantasias, não esquecendo de olhar de vez em quando para o retrovisor da realidade que ficou para trás.
De que maneira a vida cotidiana se manifesta no que escreve?
Franci Fernandes – A vida cotidiana é uma fonte de inspiração inesgotável. Há um pouco de mim e das pessoas com as quais eu convivo em cada personagem. Não posso e nem devo deixar passar despercebidos os acontecimentos que se processam a minha volta, sem tirar deles grandiosas lições. Tristeza, alegria, revolta, esperança, fracasso, realização, qualquer que seja o sentimento experimentado no cotidiano, ele irá se refletir de alguma forma no que estou escrevendo. Cabe a mim transformá-los. Isto é natural.
O que escreve no momento ou pretende escrever?
Franci Fernandes – Estou escrevendo um romance polemico onde o protagonista é Jesus Cristo. A História Bíblica – o Novo Testamento – se projetará numa gigantesca tela diante dos olhos de um menino abismado… e tomará rumos inesperados. Logo que ficar sairei em minha penosa jornada rumo a publicação.
.Publicado originalmente em O Santo Ofício (Mossoró, 2008)