Servia o melhor e mais honesto café da manhã, em fartura e qualidade, como nas velhas casas sertanejas de minha infância rural, cheia de prelúdios. Era o Café de Nobaldo, casa de taipa com três portas baixas, que dispensava placas e identificação.
Parece uma bodega remanescente de outras eras, com o seu balcão de madeira brilhosa com fiteiro onde, havia um bom tempo já, não tinha nada a mostrar ou a oferecer. Ao fundo, prateleiras desfalcadas de bebidas e a simpatia do nosso anfitrião que gozava de grande conceito dos comerciários, alguns fazendo três refeições, de segunda a sábado, nesse ancoradouro de bons momentos na companhia de Jorge Amado, Alcyone Abrahão, Osório Almeida, Sante Scaldaferri, Thiago de Melo, Newton Navarro, Waldemar Henrique, Jarbas Martins, Odosvaldo Portugal Neiva, Henrique Miranda Sá, João Maria Alves, Siron Franco, Volonté, Padre José Luís, seu conterrâneo que tinha um vale-refeição permanente, e Olney Kruse, ali fizeram o desjejum.
Ali, por volta das 6 e meia, Kip Chinian saboreou, pela primeira vez, ao voltarmos de uma noitada movimentada, o pirão originário, expoente de nossa gastronomia-raiz. O pirão pareceu a Kip uma obra-prima, algo de textura veludosa, da cor de ouro reluzente, macia e saborosa ao paladar revigorado. Um homem que no curso da vida economizou e comprou terras em São José de Campestre, onde esperava viver em plenitude, plantando, colhendo, criando, de volta a um sonho da mocidade laboriosa. Em São José de Campestre, onde viu a luz pela primeira vez.
Era uma mesa à sertaneja, cheia de tentações e vitualhas de primeira. Tudo de ótima procedência, como o leite sem mistura; ovos frescos; frutas amadurecidas au naturel; tudo escolhido a dedo, para a satisfação de uma clientela fiel e de paladar exigente. De merenda doce, a Cartola, banana anã assada com queijo de manteiga, açúcar cristal e canela, era especialidade da casa
Homem pitoresco e cordial que nos deu, por muito tempo, esse homem inteligente e esperto comerciante, valorizando quem se fazia reconhecido por seu mérito, lutador como ele, Nobaldo, que sonhava viver seus derradeiros dias pisando com os pés nus o capim orvalhado, acordando todos os dias com o trinar da passarada; plantando; cuidando; colhendo os frutos terrestres. Respirando o ar benéfico que precede as chuvaradas e, depois, a terra encharcada.
Notável conversador, resistia num primeiro momento as tentativas de conversas. Fazia-se necessário ganhar a sua confiança. Causeur, sabendo entreter-nos com espirito e verve, nem sempre em tom católico, sabia entreter-nos com sua boa conversa de sertanejo avisado, sempre instrutiva e necessária. Conhecia, como poucos, comerciantes e a freguesia da Cidade Alta, bairro histórico, em torno do qual a cidade nasceu.
Magro, alto, de bigodes grisalhos bem aparados, ficava à entrada, atrás do caixa, conversando e atendendo a clientela fiel. Sempre zeloso e atento. A discrição em pessoa. Dizem-no um bom patrão. Alguns que trabalharam com ele, desde o começo, já se aposentaram; outros queriam ocupação e trabalho honesto.