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Crônica mossoroense, eis

Fundador da Navegos reverencia o escritor e jornalista José Nicodemos, que há mais de meio século encanta com seus textos leitores de Mossoró e de todo o Rio Grande do Norte; apesar de discreto, o também filósofo e gramático ocupa lugar de destaque na literatura e na imprensa do Estado

Franklin Jorge

Signatário da melhor crônica da imprensa diária do Rio Grande do Norte, José Nicodemos ama a lâmpada e o silêncio. Filólogo, gramático é arguto observador dos fatos que estruturam a nossa comédia humana, gostando de ler e escrever acicatado pelo demônio da lucidez. O jornalismo passou a fazer parte de sua vida há mais de 50 anos, quando passou a brilhar em uma arena que constitui, para Baudelaire, uma forma de advocacia popular, em síntese, todo o jornalismo bem-intencionado e praticado em favor da sociedade.

Conheci-o, da primeira vez em que vivi em Mossoró, como chefe da Sucursal dos Diários Associados no Oeste Potiguar, entre 1993 e 1995 e nos anos de 2006 a 2009, na Boa Vista, uma rua afortunada por bons vizinhos, dos quais desde então tenho aguardado a lembrança. Passei a ler o que passou a publicar na “Gazeta do Oeste” e, por fim, seu porto constante no diário “De Fato”, editado por Edilson Damasceno. Além do corpus da coluna, escreve pequenos tópicos, em desdobramentos de um acontecimento ou tradição, entre os quais o bom uso da gramática, traduzida e explicada em uma forma acessível a todos, pois como mestre que é, o faz sem ranço professoral, cativando a todos com o seu charme verbal.

Em Mossoró, muitos o leem e aprendem com o que escreve José Nicodemos há meio século. Um elegante cavalheiro, de ar distinto, sempre vestido de linho e cambraia de linho, de agradável conversa, acima de tudo um indivíduo que estima e valoriza o anonimato, a discrição, como ex-seminarista e discípulo do professor Antenor Nascentes, em cuja companhia viveu em anos de seu aprendizado no Rio de Janeiro, por toda vida redigindo e revisando textos, absorvido na mais humilde das tarefas intelectuais: a revisão de textos alheios, na condição de revisor de jornais e de servidor público.

Nascido em Areia Branca, no Oeste potiguar, suas memórias tem a cadência do mar. Fez-se pela força do espírito e da cultura adquirida, um grande leitor da vida a refletir e a meditar sobre as coisas do século. Encontrá-lo, numa esquina a caminho do jornal, proporcionava-me uma festa do espírito. O delicioso Pão dos Anjos que alegra a alma. Ao ouvi-lo, constatava quanto tem sido subestimado em seu valor, ignorado em seu mérito, como autêntico intelectual que pensa e escreve em estado de consciência, como criador de uma prosa a um tempo fluida e densa. Quando morrer, Deus nos livre!, terá perdido Mossoró um mestre de gerações de leitores encantados, a maioria desagradecida. E o seu mais importante humanista terá à sua esquerda Dorian Jorge Freire e, à direita, Jayme Hipólito Dantas. Com Raimundo Soares de Brito forma o Panteão mossoroense.

Franklin Jorge, diretor de Redação da Navegos, é autor dos livros “Ficções Fricções Africções” (Mares do Sul; 62 págs.; 1999), “O Spleen de Natal” (Edufrn; 300 págs.; 2001), “O Livro dos Afiguraves” (FeedBack; 167 págs.; 2015), dentre outros.

ARTESÃO DAS FRASES PERFEITAS Um dos grandes nomes do jornalismo norte-rio-grandense, José Nicodemos é autor do livro “Rastros nas Areias Brancas” (Sarau das Letras/Coleção Mossoroense; 210 págs.; 2012)