*Alexsandro Alves
Este é o quarto de uma série de cinco artigos sobre a pós-modernidade, o artigo anterior se encontra aqui: https://www.navegos.com.br/do-mundo-como-ideologia-e-representacao-2/
Nietzsche, em muitos de seus escritos mais polêmicos, sobretudo nos de seus últimos anos de vida criativa, falava sobre “amolecimento cultural”, podemos afirmar que a filosofia do pensador é dura, por isso a imagem do martelo lhe cai bem.
Por amolecimento cultural, o filósofo entendia, basicamente, “os direitos iguais”. A grande política é a política do mais forte. A hierarquização da vida em Nietzsche o fez, sempre, afastar-se dos ideais da Revolução Francesa. É por isso que denomina o cristianismo de “revolta dos escravos” e a política e a cultura de sua época de “moral do rebanho”. Esse louvor à brutalidade e à violência, vinda de um filósofo, foi uma pancada no estômago de muitos, mas, acabou sendo abraçada pelos movimentos totalitaristas de 30, sobretudo o nazismo. A valorização da força e do Super-Homem, como um ser além do bem e do mal, leva o filósofo às últimas consequências lógicas, quando, em “O Crepúsculo dos Ídolos” e antes, em “Aurora”, ele menciona o estado de natureza humano como superior ao homem da cultura, “domesticado”. Na “Genealogia da Moral”, ele se pergunta onde está a besta loura germânica que aterrorizava os povos.
O relativismo cultural, que se inicia na antropologia de Malinowski e alcança seu primeiro cume com os estruturalistas, é uma espécie de amolecimento cultural. O que faz todo o sentido ao estudarmos culturas distantes e diferentes da nossa, ao ser colocado dentro da nossa própria cultura, gera esse amolecimento cultural – ou ao menos gera uma vergonha em ser diferente. Essa vergonha alimenta uma cultura amolecida, apalermada, a cultura contemporânea. Ninguém mais sofre, por exemplo. Lembro que Nietzsche observa que chegar ao ponto em que ele chegou, é necessário passar pelo peso de mil atmosferas. O sofrimento, quando nosso espírito é forte para vivê-lo, é uma recompensa que gera grandeza e firmeza de caráter. Sofrer sem se dobrar, como um metal que nunca encontra seu ponto de dilatação.
Há alguns dias, vi uma notícia chocante: um campeonato não entregou medalhas aos primeiros lugares, “para não magoar os perdedores”. Em algumas escolas não há mais “dias dos pais” ou “dia das mães”, há “dia da família”, para não magoar que não tem mãe ou pai.
Acontece que não magoa. Magoa se colocar na cabeça da criança que magoa. E é o que ocorre hoje. O sistema está impondo uma visão de mundo amolecida. Em breve não teremos mais homens nem mulheres, teremos pombinhos e pombinhas da pós-modernidade. E isso não está dando certo, estão criando uma geração de dependentes emocionais altamente magoáveis.
A imposição de colocar na capa de um livro o alerta “contém gatilho” é mais uma demonstração de como as pessoas estão com medo de sofrer, de como estão fracas, de como nossa cultura hoje é a cultura do amolecimento emocional. Querem exorcizar demônios reais negando-os. Mas o homem e a mulher fortes vivem com seus demônios batendo à porta!
Hoje mesmo, em um ônibus, uma mulher subiu e pediu um “boa tarde” para ela. Sua voz afinava cheia de vulnerabilidades à medida que ninguém lhe respondia e ela insistia em receber um “boa tarde” de todos. Chegou ao ponto de implorar um “boa tarde”. Ninguém de fato respondeu. Talvez essa imposição de tornar as pessoas magoáveis também esteja gerando seu contrário, pessoas com instintos de crueldade.
Olhei para ela e pensei: “a crueldade e a vulnerabilidade!”. Olhei ao redor, e todos em seus celulares. Ninguém estava ouvindo-a.
(Continua)…