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O Novo Fardo da Crítica

Alexsandro Alves, escritor e professor, analisa a questão da intersecção entre a política e a estética na crítica literária no panorama do livro no Brasil contemporâneo

*Alexsandro Alves

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O desafio hoje, para quem escreve, é sobreviver em um mundo que torna a crítica refém de grupos minoritários que, através das redes sociais, fazem tanto barulho quanto dois gatos brigando no telhado. Tivemos disso, em tempos recentes, um exemplo basilar: a crítica que Luiz Maurício Azevedo escreveu para “Homens pretos (não ) choram”, de Stefano Volp.

É chocante para alguns, mas é necessária a constatação de que a crítica não pode fincar suas estacas em partidarismos ou movimentos sociais específicos. Ela precisa ser isenta de seu próprio tempo nesse sentido: se abster de política. As frequentes e desnecessárias polêmicas sociais em torno da vida e da obra de Monteiro Lobato passam longe da riqueza que é sua literatura.

Porque o crítico que observa seu objeto de trabalho, os livros, a partir de um ponto de vista primeiramente político, já delimita sua análise, e o gosto que formará com sua crítica, o crítico precisa formar leitores conscientes de literatura e não de ideologia. Para não mencionar o tom festivo que pode se apoderar da escrita pelo viés da igualdade social.

O crítico precisa ser parnasiano. O que vale numa crítica literária é a relação da palavra com a palavra e como essa relação tem sentido estético ou não tem dentro da obra analisada. As questões sociais e políticas que a obra contiver devem ser analisadas, mas não podem invadir o primeiro plano da análise e não podem balizar as sentenças críticas da análise como um todo.

E observamos hoje que o que a crítica literária tem de menos é literatura. Há muito festejo de inclusão, muita gente que está vendo a facilidade de se projetar defendendo uma causa política através de livros ordinários, mal escritos e com forte apelo – uma dependência mesmo – para a autopromoção em redes sociais. O identitarismo é o caixão da boa literatura.

Antônio Cândido pontuava suas críticas literárias com uma dose de partidarismo político, embora que com sua erudição ultrapassasse esse desarranjo. Porém ele formou mal seus continuadores – se é que no Brasil há tais. A crítica brasileira hoje é uma espécie de Antônio Cândido desnatado. Ficou só o elemento político, ainda piorado pelas “questões das minorias”.

Melhor dizendo: a questão política foi afunilada na questão das minorias. As questões estéticas que deveriam estar em primeiro plano, foram postas na periferia de um parágrafo. Cândido não escrevia assim. De fato, é mais simples e mais engajadora a política rasteira do que a apreciação estética de um objeto estético que é um livro.

Há o medo de ser “cancelado” como machista, racista ou contra a comunidade LGBT+. Me parece que há um surgimento de leitores hipermelindrados e incapazes de sentir os abismos aos quais uma escrita de peso pode empurrar a alma, ao mesmo tempo em que tais leitores e críticos, de antemão, pela cor ou pela sexualidade, já se colocam a elogiar, porque “há visibilidade”.