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O preço das Ilusões e a gratuidade do real

Será que fazemos um favor a nós mesmos nos fantasiando com nossas ilusões?

*Oliver Harden

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A realidade, esse espetáculo sem ingressos, nos é dada de forma absoluta, sem que a desejemos ou a escolhamos. Seu valor? Nenhum. Seu custo? A própria existência. No entanto, incapazes de suportar a vastidão desse presente imerecido, buscamos adorná-la com ilusões, como se fosse insuportável encarar a nudez do real sem os véus da ficção.

A vida, em sua essência, é desmedida e gratuita. O tempo nos é concedido sem contrato, e a morte nos espera sem taxa de devolução. Nenhum esforço foi necessário para que existíssemos, nenhuma justificativa nos foi oferecida para estarmos aqui. Mas o espírito humano, avesso ao vazio, não tolera essa gratuidade. O que não tem custo nos parece desprovido de sentido. Assim, compramos ilusões, não porque queremos ser enganados, mas porque precisamos dar peso ao que nos é dado sem cobrança.

As ilusões, então, tornam-se a moeda simbólica com que pagamos a existência. Pagamos com deuses, para que o acaso se torne providência; com narrativas, para que o caos se torne destino; com promessas, para que a efemeridade se transforme em esperança. Compramos o amor para nos salvar da solidão, compramos a glória para disfarçar a transitoriedade, compramos certezas para atenuar o absurdo. Toda crença, todo sonho, toda ambição é uma forma de consumo metafísico, um artifício para revestir de substância aquilo que, em sua essência, é vazio.

Mas eis a ironia: por mais que nos endividemos com ilusões, a realidade continua gratuita. Nada pede em troca, nada exige de nós, e talvez seja exatamente isso que nos atormente. Camus nos lembra que o absurdo da existência não é sua dificuldade, mas sua falta de explicação. Não há fatura a pagar, mas queremos acreditar que sim, pois um preço sugere um propósito.

E então, o que nos resta? Permanecer na ilusão, adornar o real com a tapeçaria de nossas crenças, ou encarar a gratuidade da existência como um luxo inesperado? Há os que compram ilusões por necessidade, há os que as vendem por conveniência. Mas há também os que ousam caminhar descalços sobre a crueza do mundo, sem adornos, sem véus, aceitando que a vida não precisa custar nada para ser valiosa.

No fim, a realidade permanece inalterada—excessiva, gratuita, absoluta. Mas nossa relação com ela depende do quanto estamos dispostos a pagar para não vê-la como realmente é.