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O que vive nos livros  

Escritor de língua francesa provoca o leitor sobre temas tão urgentes no meio literário: a crítica e criação a partir de uma entrevista com Jean-Carrière de 1986.  

*Julien Gracq

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Eu não acho que o que você diz é muito intrépido. Só que esse “conjunto de relações positivas e negativas que relacionam as obras entre si” nem sempre fica claramente evidente, e pode melhorar quando explicado. E é afinal, grosso modo , o que tenta fazer a crítica, cuja perspectiva é na maioria das vezes profundamente histórica e comparativa. No que me diz respeito, o título que dei a um dos meus livros, Reading Writing (sem vírgula) indica que a passagem da leitura (necessariamente em parte crítica) à escrita se faz sem angústia ou tensão, sem qualquer sentimento de alienação ou perda de discernimento. algo próximo da provação dos sentidos.

Acredito -e já escrevi em algumas ocasiões- que todo livro surge (em grande parte) de outros livros. A necessidade quimérica, que atinge “muitos criadores”, de nada dever à literatura que os precedeu, não me preocupa. O mundo e a biblioteca fazem igualmente parte dos elementos a que me refiro quando escrevo, e nunca me envergonharei disso. Ficções e reflexões sobre a leitura sempre, e desde o início, estiveram mais ou menos misturadas em todos os meus livros. Mas isso só é possível com a condição de deixarmos de lado a “ciência da literatura” e só lermos de acordo com o que realmente vive nos livros. Eu só me importo com minhas preferências. A literatura sempre recompensa aqueles que mantêm uma relação calorosa com ela. Que, por devoção morreram de frio.

[…]

Não gosto de usar a palavra criação na literatura, e menos ainda na crítica. Só há criação quando ela parte do nada, e a literatura, no melhor dos casos, nada mais é do que uma recomposição, uma montagem, de sensações, percepções e lembranças. Não me parece que o aspecto negativo domine nas obras críticas que tenho publicado, muito pelo contrário. Talvez tenha sido o escândalo que se formou no tom da Literatura como um blefe o que nos permite supor isso; mas esse trabalho tratou apenas da introdução do não-literário na literatura. Falei, sobretudo, em matéria de crítica, das minhas preferências, do que gostava; Além disso, estou convencido da verdade contida na frase de Malraux que tanto gosto de citar: «O contra (na arte) não existe». O medíocre não tem mais justificativa do que o silêncio, onde uma gravidade natural o arrasta: basta “deixar ir”.

Foto: Julien Gracq, por © Jean Suquet