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O romancista da cidade

Alexsandro Alves, escritor e professor, descreve suas impressões em relação a uma obra literária contemporânea, mas já clássica: “O Spleen de Natal”, do escritor Franklin Jorge.

*Alexsandro Alves

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Franklin Jorge escreve pintando, e isso é uma característica que apenas ele possui entre seus pares. Lemos seus livros com calma. É essencial que o tempo seja apenas para ele. A maleabilidade com a qual o escritor desenha seu texto linha após linha coloca nossa percepção em um estado permanente de encantamento, parece que das tintas de seu texto emanam sons como o do nascer da manhã: vagaroso e irradiante.

Essas pigmentações literárias conseguidas através de um trabalho minucioso com a gramática e com a técnica, torna qualquer livro em prosa de Franklin Jorge uma exposição impressionista.

É assim que leio seus livros. Como se diante de um pintor impressionista. A captação da luz que os impressionistas conseguiram pictoricamente, Franklin conseguiu pelas palavras. Seu domínio do texto é um deleite evidente para qualquer um que ame a arte de escrever. Seu texto é incompatível com a pressa.

Lívio de Oliveira, da UBE/RN, assim o descreve: “Franklin, todos sabem, é um minucioso e exigente estilista do texto, que desenha as palavras diante dos nossos olhos atentos e embevecidos como um artista nipônico escreveria letras ancestrais, numa caligrafia exata e indelével. Ler um texto de Franklin Jorge nos faz perceber os cuidados do ourives e do artista fiel à palavra. Isso significa, em síntese, receber uma aula de estilo e de saberes múltiplos e refinados.”

É o único escritor potiguar vivo senhor de um estilo tão inconfundível. Franklin Jorge não se deixa confundir. Nunca.

O Spleen de Natal marcou época pela originalidade do forte sopro literário que emana de suas páginas. Esse livro sensibiliza a todos que o leem. Eu o li ainda jovem, em 1996 e me pareceu absurdamente novo, pelo estilo, pelo fraseado musical dos seus parágrafos, o livro era personalíssimo e me tomou de tal modo que lia e relia suas páginas como se fosse sempre uma primeira vez. Porque a sinestesia entre cor, som e palavra que há nessa obra fez com que eu não a compreendesse de imediato, como se fosse uma música instrumental, apenas sentia e amava, mas se me perguntassem, naquela época, sobre o que é esse livro, eu me calaria.

Porém a vida radiante que existe nas palavras tocadas por Franklin Jorge me fazia retornar a sua incompreensibilidade. E aos poucos aquela espécie de música absoluta em parágrafos se tornou pintura de palavras, e a cidade vislumbrada por Franklin Jorge se descortinou, assim aos poucos, em um esplêndido drama musical.

Por causa do Spleen, vi Natal com outros olhos. Passeava e passeio por suas ruas e secretamente a memória me falava e fala: é sobre isso aqui que Franklin escreve, dentro dessas casas e apartamentos, nas ruas, ele executou um painel, um afresco da cidade.

Um painel vivo em qualquer ângulo. Um portentoso mosaico de tipos ideais desfila suas vivências adornadas pelo verniz de um mestre. Que alma e intelecto generosos seu escritor possui! Haverá o tempo, em que para termos ideia do que pode esta cidade, teremos que conhecer seu Spleen, que é o seu romance.

Esse livro, que é um monumento à glória literária do Rio Grande do Norte.

 

Mapa do século XVII com o Forte dos Reis Magos

 

 

A Igreja do Galo