*Da Redação
O ex-presidente Bolsonaro sempre foi criticado por sua defesa de métodos de tratamento alheios à comprovação científica. Explodiram manifestações da classe média branca universitária, nas redes sociais, contra a atitude genocida de ser favorável a tópicos de saúde não aprovados pela ciência. Surgiram termos como terraplanismo e a coisa ficou tão gritante na época, que ser a favor ou contra uma picada de agulha se tornou ideologia política.
Agora o presidente Lula aprova um tratamento que vem causando controvérsia entre os conselhos de medicina do país. Mas não se ver aquela galera antenada vociferando nas redes sociais depois de fumar um beck.
Estão calados.
Passou o tempo da indignação.
Talvez até se explique. Com a amizade cada vez mais estreita do atual presidente com Alexandre de Moraes, a galera da revolta e da indignação pop, resolveu botar panos quentes.
O texto abaixo é da Tribuna do Norte.
A ozonioterapia voltou a fomentar discussões na classe médica após a publicação da Lei nº 14.648, sancionada pelo Governo Federal, que autoriza e regulamenta o uso da alternativa como procedimento complementar. Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (Cremern), Marcos Jácome, a norma pode ser considerada uma “precipitação”. Isso porque o Conselho Federal de Medicina (CFM) não concluiu os estudos sobre a eficácia científica do procedimento, iniciados em 2018, e ainda não há respaldos suficientes para a entrada da norma em vigor.
O presidente do Cremern aponta que a expectativa é que os estudos do CFM sejam finalizados até o final deste ano. Em nota, a entidade federal destacou que os trabalhos seguem normalmente mesmo com a autorização do método pelo Governo Federal. “A sanção da Lei nº 14.648/23, pela Presidência da República, não contradiz os termos da Resolução nº 2.181/2018, do Conselho Federal de Medicina (CFM), que continua em vigor, sendo que a autarquia mantém grupo de trabalho específico que avalia a eficácia e a segurança do uso da ozonioterapia”, diz a publicação.
A Lei Nº 14.648 foi publicada no Diário Oficial da União na última segunda-feira (7) e estabelece que a ozonioterapia só pode ser feita por profissionais de saúde que estejam dentro do seu respectivo conselho de fiscalização profissional. Aliado a isso, a norma orienta que o procedimento seja aplicado por meio de equipamento de produção de ozônio medicinal regularizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou órgão que a substitua.
Embora o Cremern compreenda que a decisão federal esteja acima da resolução do nº 2.181/2018 da CFM, que considera a ozonioterapia como procedimento experimental para a prática médica, Marcos Jácome reitera a necessidade de comprovação do método para aplicação nos pacientes. “A gente continua com esse raciocínio de que o método para poder ser liberado precisa ter a comprovação de eficácia e segurança para utilização na nossa população”, complementa.
Atualmente, esclarece o médico, a ozonioterapia tem uso experimental ramificado, com destaque para tratamento de lesões de pele e feridas. Neste caso, ocorre o envolvimento da área lesionada com o gás ozônio visando a melhora da região afetada. “Tem pessoas que tem um ferimento e tem uma dificuldade de cicatrização, então algumas pessoas já fizeram uso de ozonioterapia para ver se tem essa recuperação mais rápida”, esclarece.
Em junho de 2022, a Anvisa publicou uma nota técnica, dentro do Processo nº 25351.910576/2022-41, listando as indicações de uso da ozonioterapia. Ao todo, o Orgão aprova o uso da tecnologia para áreas de dentística (tratamento da cárie dental); periodontia (prevenção e tratamento dos quadros inflamatórios/infecciosos); endodontia (potencialização da fase de sanificação do sistema de canais radiculares; cirurgia odontológica (auxílio no processo de reparação tecidual) e estática (auxílio à limpeza e assepsia de pele).
Na publicação, contudo, a Agência reforça a ausência de evidências científicas consistentes para aplicações em outros casos. ”O ozônio é um gás com forte poder oxidante e bactericida. Devido a estas características, é utilizado para fins odontológicos e estéticos, não havendo, até o momento, nenhuma evidência científica significativa de que haja outras aplicações médicas para a utilização de tal substância nas modalidades de ozonioterapia aplicada em pacientes”, afirma a nota.
Segundo o presidente do Cremern, há cerca de cinco anos o grupo de trabalho do CFM está realizando pesquisas voltadas à compreensão dos pontos positivos e negativos da ozonioterapia. O início dos estudos acompanhou o lançamento da resolução nº 2.181 de 2018, ano em que o Ministério da Saúde incluiu a terapia com ozônio no conjunto de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), institucionalizadas pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC).
Na avaliação do Cremern, aponta Marcos Jácome, a inclusão do método foi ausente de cuidados com relação ‘aos potenciais riscos’ que a terapia com ozônio pode ter. Ainda, de acordo com ele, a decisão apenas buscou facilitar o acesso ao procedimento, que pode ou não ser prescrito ao paciente pelos médicos. Somado a isso, a recomendação pode gerar resultados negativos aos profissionais. “Atualmente, mesmo com a portaria do Ministério da Saúde, se tiver um dano grave a um paciente e ele entrar na justiça contra a pessoa que passou a medicação não estando liberado oficialmente, eu posso ser responsável civilmente e criminalmente por algum dano”, ressalta.
Marcos Jácome pontua que os estudos do CFM acontecem, nesse sentido, para se chegar a uma visão mais consistente da ozonioterapia a partir de avaliações rotineiras, produção de relatórios e comparação de resultados. “A gente não pode se basear em coisas pequenas, a gente precisa de uma estatística maior para ter mais segurança”, destaca o presidente. Uma vez que a quantidade de estudos for suficiente, continua, há duas possibilidades principais de conclusão: a afirmação de que o método traz riscos e não deve ser utilizado, ou que as pesquisas apontam para resultados mais positivos.
Aliado a isso, conforme o presidente do Cremern, uma nova resolução deverá ser feita pelo CFM para substituir a que está em vigor. Caso os resultados sejam positivos, o Conselho também vai especificar para quais casos o tratamento com ozônio é mais eficaz, em quais regiões do corpo e quais são as contraindicações. Ele reforça, portanto, a importância da lei agora em vigor considerar o ponto de vista técnico e ético das pesquisas do Conselho. “Para a segurança do médico e da nossa população, o ideal seria só definir como atividade normativa, regulada e liberada a partir da conclusão desse trabalho”, finaliza. Até o momento, não há definição se o CFM vai entrar com recurso contra a norma sancionada pelo Governo Federal.
Nessa edição de Navegos, os colunistas e seções (clique nos nomes para ir direto ao artigo): Alexsandro Alves, Abraão Gustavo, Edek Kowalewski, Percival Puggina e Calle del orco. Desfrutem.