*Alexsandro Alves
Qual o valor de uma obra de arte? De uma pintura? De uma escultura? De uma composição? De um livro? E o que esse valor significa?
Não está este valor em seu tamanho. Um soneto de Petrarca é tão grandioso quanto “Os Lusíadas”; assim como uma sonata de Mozart em relação a uma sinfonia de Beethoven. O valor da obra de arte está em sua relação com o tempo, e por sua vez, do tempo com o homem, e é dele que a obra de arte fala para ser perene. Melhor dizendo, é de um tipo de homem que a obra de arte fala e assim se torna perene.
“De um tipo de homem” porque o homem grego não é o renascentista; assim como o homem renascentista não o homem moderno. No entanto, as grandes obras de arte renascentistas são grandes hoje porque abarcaram o significado de ser homem (humano) naquele período. Por isso são admiradas hoje, por uma humanidade avessa aos princípios estéticos que nortearam a mão de Rafael Sanzio.
É possível entendermos a humanidade a partir da obra de arte. Isso os arqueólogos executam no campo da ciência. Mas no plano puramente estético também é possível. É disso que falei no artigo “A poesia do futuro será um sopro”. Não foi sobre o tamanho de um poema. Foi sobre o significado desse poema para a modernidade e do mesmo enquanto produto nascido das urgências contemporâneas.
Recentemente escrevi nove artigos sobre as nove sinfonias de Beethoven (falta um décimo). Beethoven é moderno? Se examinarmos os sentimentos e as perspectivas humanistas de suas sinfonias, sobretudo na Nona, diríamos que “sim” apenas se a palavra “universal” se fizer presente. Beethoven é universal. Porém, o homem que emerge das sinfonias de Beethoven, em suas particularidades, é o homem moderno? Não. Mahler é moderno nesse aspecto. Porque Beethoven afirma sempre. Mahler duvida e é inseguro sempre. Mesmo quando tenta se afirmar, é mais desespero do que vitória. Esse é o homem moderno. Cheio de fraturas. É como a pintura divina de Rafael ou a heroica de Michelangelo em relação à angústia de Münch ou ao pavor de Bacon – ou ao microscópico quase sorriso de da Vinci (por esse detalhe, a Monalisa acena para nós). Aqueles renascentistas, ao executarem seu tempo e o homem que dele emergiu na sua produção, se tornaram imortais. Da mesma forma Münch e Bacon. Quando se observa uma “Madona Sistina” e um “Autorretrato com olho ferido” a questão não se um é bonito e o outro é feio. A questão da arte é o homem. E as duas pinturas mostram o homem em seu tempo, no tempo de Rafael e no tempo de Bacon. Essa verossimilhança torna a obra perene, mesmo que não possamos, por circunstâncias sociopolíticas diferentes, pintarmos como os renascentistas. O Belo está na beleza renascentista e na feiura modernista.
Assim como na poesia minimalista. Que justifica esteticamente a emergência de um homem tecnológico, apressado e ao ponto de dividir sua humanidade com a cibernética. Mas precisamos notar também que a contemporaneidade é o tempo em que confluem muitos humanos, de ontem, de hoje, de amanhã e assim é que a estética atual possibilita um novo universal humano, a partir do mínimo, a partir do diverso espalhado em mil representações geográficas e sociais. Se vai ficar para o futuro, não sabemos, mas o que ficar, falará exatamente desse homem que se tornou universal nas partículas de um microchip.
É uma tendência, dentre várias outras, na contemporaneidade.