*Da Redação
Grace Ann Melzia Bumbry (St. Louis, 4 de janeiro de 1937 – Viena, 7 de maio de 2023), foi uma cantora de ópera, uma das primeiras cantoras negras, seguindo o caminho aberto por Marian Anderson.
Bumbry foi uma mulher controversa em sua carreira estelar. O mundo da música clássica é um território em que as fronteiras são sempre muito bem delimitadas, em que mudanças bruscas nunca são bem-vindas.
Bumbry iniciou sua carreira como mezzo soprano, depois estava cantando papéis de soprano e, por fim, cantava tanto os de mezzo quanto os de soprano. Isso provocava intensas discussões sobre seu verdadeiro alcance vocal, público e crítica afirmavam que a mesma não era uma soprano, mas em 1993 Bumbry subia aos palcos para cantar nada mais nada menos do que Turandot, o mais difícil, chegando aos limites da crueldade, papel para soprano dramático de Puccini!
Também foi a primeira intérprete negra a cantar Wagner em Bayreuth. Novamente controversa, suas especialidades eram a ópera italiana bel-cantista e também a ópera francesa. Em Bayreuth, sem dúvida, também houve um indisfarçável componente racial por parte do público. Lá, ela interpretou a deusa romana do amor Vênus, da ópera Tannhäuser. E tivemos uma das mais celebradas e aclamadas personificações dessa personagem wagneriana. Mesmo nunca tendo se especializado de fato no alemão, sua Vênus permanece intocável. A delícia deslizante de sua musicalidade em “Geliebter, sag’, wo weilt dein Sinn?” (Amado, fala, por onde vaga tua mente?), a primeira frase da personagem, é marcada por uma linha melódica ao mesmo tempo onírica e plena de volúpia. Essa produção, dirigida por Wieland Wagner e regida por Wolfgang Sawallisch, se encontra disponível no mercado.
Bumbry marcou seu lugar na ópera com uma independência poucas vezes alcançada pelos intérpretes. Parecia que geria sua própria carreira ao cantar personagens de linhas vocais tão díspares. Maria Callas também. Mas esta pagou cedo o preço por certa indisciplina: sua voz perdera o frescor cedo demais. Já Bumbry conseguiu uma vida artística mais duradoura. Sua voz e sua interpretação dramática estarão para sempre nos anais da ópera em seus momentos mais culminantes do gênero no século XX. Controversa, sempre! Porém sempre reconhecidos o talento e a grandeza ímpares de sua presença no palco. Obrigado por suas duas grandes gravações de Carmen, por sua Vênus, por suas Amnéris, Abigail, Orfeu e Lady Macbeth, todas registradas para a posteridade em áudio e algumas também em vídeo. Além disso, há os registros de recitais de bel-canto e as gravações de música sacra conduzidas por Maurice Abravanel em Utah, da década de 50.