Franklin Jorge
Interrogado certa vez pela situação de penúria dos nossos artistas, o secretário de Entretenimentos da Prefeitura do Natal respondeu que seria tudo uma questão de “nicho”. Segundo Dácio Galvão, o mais longevo e despreparado de nossos pseudogestores culturais, nossos artistas, por serem provincianos, ainda não teriam esse nicho.
Ora, creio que o secretário se precipita ou tem uma visão caolha do problema que não lhe parece dizer respeito, embora há quase duas décadas venha se esforçando como pode para ser reconhecido como o “bambambam” da cultura provinciana. Um sujeito, enfim, que desconhece a verdadeira natureza do cargo que ocupa para o mal de nossos artistas.
O secretário usa o seu cargo como propriedade privada. Usa e abusa dele, graças à indiferença do Ministério Público. Não tem respeito pelo público e pensa que a cultura é apenas uma festa paga compulsoriamente pelos contribuintes. Uma verdadeira extorsão. Desde que o secretário tenha boa vida e possa desfrutar do cargo como instrumento de autopromoção contumaz. É costume seu, em solenidades públicas, fazer-se acompanhar por uma dupla de violeiros – paga com dinheiro público – para fazer-lhe a louvação e exaltar-lhe os méritos falaciosos.
Somente uma criatura desinformada podia recorrer a tal argumento. Toda pasta é criada com um propósito, e toda gestão precisa ter um planejamento e projetos capazes de otimizar, por exemplo, a agricultura, a saúde pública, a segurança, a educação, a infraestrutura, saneamento básico ad infinitum… Por que teria de ser diferente com a cultura, Doutor Dácio? Será por inércia, falta de visão ou despreparo que pensa assim? Dar tempo ao tempo, sem fazer a parte do esforço que caberia a um gestor cultural sério que prezasse a cultura e respeitasse os artistas?
No entanto, costuma o secretário recorrer a conceitos supostamente globalistas, como “multicultural” e “economia criativa”, que ele encaixa alguma vez para nos fazer suspeitar que é bem-informado e dá conta do recado. Não é bem assim: o secretário é um farsante que atanaza seus assessores com imprevistos que podiam ser evitados se houvesse, de fato, competência, seriedade e talento por parte de Sua Excelência.
Para nossos gestores de cultura – Dácio é apenas mais um deles –, cultura é um reles sinônimo de festa ou de orgia como sugere a Batalha do Vinho, com a qual a Funcarte ludibriou a população da zona Norte ao premiá-la com um evento de nome que dá o que pensar. Sobretudo, um evento chancelado por uma instituição que se diz cultural, apesar dos fatos dizerem o contrário. Em vez de levar cultura ao povo da Zona Norte, promoveu orgias e drogas, em desconsideração ao povo da Zona Norte, talvez por serem moradores de periferia. Uma grandíssima falta de respeito.
Franklin Jorge, diretor de Redação da Navegos, é autor dos livros “Ficções Fricções Africções” (Mares do Sul; 62 págs.; 1999), “O Spleen de Natal” (Edufrn; 300 págs.; 2001), “O Livro dos Afiguraves” (FeedBack; 167 págs.; 2015), dentre outros.
MANOS E MINAS MCs duelam durante uma edição da Batalha do Vinho; o evento é realizado no Espaço Cultural Jesiel Figueiredo, em Gramoré, zona Norte de Natal