*Francisco Alexandro Alves
É muito bom quando encontramos um poeta e sentimos que o mesmo tem aquela chama de criatividade que esperamos em alguém que se denomina a si mesmo poeta.
Li o livro de poemas Post Mortem, de Roberto Noir, e quero falar sobre minhas impressões deste livro.
Primeiramente que não é um livro perfeito. Há problemas nele. Todavia, o que há de bom é verdadeiramente bom. Noir tem um talento para sentimentos femininos e sombrios, que sem dúvida deverá refinar em outros trabalhos futuros. Sua alma como escritor é feminina, na mais sensível acepção desse termo. Este poeta tem talento.
Post Mortem narra em versos um acontecimento sombrio, o assassinato de um jovem amante pela sua amante, também jovem. Parece ser feito para ser cantado. Como uma cantata profana à la Carmina Burana. É um poema que classifico como poema lírico-dramático e que ocupa boa parte do livro, é um poema longo, dividido em capítulos. Ao final deste longo poema, o livro se completa com poemas curtos.
Como já mencionei o texto do autor tem qualidades sombrias e femininas. Em seus oito poemas finais, percebemos essa delicadeza no fazer poético que encantou este crítico. É uma delicadeza aveludada de trevas, e nesse aspecto adornado de luzes tristes. 1º de janeiro, Lindo, mas mórbido, e Coveiro de mim mesmo são poemas carregados de um vento frio, como que se andássemos pelo centro da cidade, circunspectos, sentido a solidão de encontros fortuitos em uma avenida do centro.
O poema central do livro, Post Mortem, tem uma qualidade dúbia. Há nele boas metáforas e imagens convincentes. Porém a forma como Noir resolveu apresentar este poema, entrecortando com ilustrações, não convence de todo. Porque seu texto é deveras mórbido e as imagens nas ilustrações nos remetem ao mundo infantil de animes japoneses. Não que um anime não possa ser sombrio. A questão é o estilo do traço do artista Jack Jackson que não faz jus ao texto. São desenhos sem muita expressividade e desfocados do assunto fúnebre do poema. Não inspiram. Eu li o poema cobrindo os desenhos com uma folha de papel. O texto de Noir não precisa de mais nada além do próprio Noir. Se foi uma escolha do poeta a inserção destes desenhos, devemos perguntar onde o poeta quer nos levar? Imagino que a palavra por si do poeta seja mais do que suficiente para responder essa questão.
Se Noir persistir em uma poesia que deseje se mesclar às outras formas artísticas, ou deverá mudar o tom de seu texto ou escolher um desenhista mais adequado aos seus temas. Porque o poeta precisa definir seu público. Para quem ele está falando. Obras com dubiedade estética podem passar como integralmente bem-feitas por um público despreparado, mas quando a obra cair em mãos mais hábeis, o estranhamento será notado.
E mais. Parece ser um cacoete estranho do poeta a ânsia por citações. Todos os capítulos do poema Post Mortem são antecedidos por um mar de citações cada vez maiores. Uma pequena epígrafe bastaria para cada capítulo. Noir, enquanto poeta, deve segurar-se em suas próprias qualidades e não dividir seu espaço com autores já consagrados. A atenção precisa estar no autor e não nas suas citações, e nem mesmo o autor, quando tem talento, deve se amparar tanto em seus mestres. Por mais que os citemos em nosso dia a dia, quando publicamos nossa obra, a ribalta é apenas nossa. No máximo uma epígrafe para cada capítulo, o que é esteticamente agradável, aliás.
Ao ler este livro, que é o primeiro de seu autor, a impressão final que permanece é que queremos ler mais de Noir. Como falei e ademais dos problemas que o livro contém, este autor possui uma grande sensibilidade e uma alma estética legítima.
Que em seu segundo livro ele se mostre por completo para nós, sem as inconveniências de desenhos sofríveis e citações exageradas. Queremos contemplar o que vislumbramos neste seu primeiro livro, um poeta.