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Que tipo você é, Onetti?

Uma carta do escritor Julio Cortazar ao seu amigo e também escritor Juan Carlos Onetti.

*Julio Cortázar

[email protected]

Prezado Onetti:

Mais uma vez encontrei lá tudo*, tudo que faz você ser diferente e único entre nós. A grande maravilha é que o reencontro não envolve a menor repetição ou a menor monotonia. Pareceria quase impossível depois da saturação que seus livros anteriores deixam na memória, mas é assim: tudo é novo novamente sob o sol, apesar do antigo Eclesiastes.

Isso acontece comigo com poucos escritores. Eu leio até certo ponto e aí penso: “gente, vamos em frente, vou me isolar no canto”. Com o passar dos anos, prefiro novos autores, experimento outras marcas de whisky. E… acontece que o seu romance é isso, sempre whisky mas com um sabor igual e diferente. Acontece que mais uma vez você escreveu um grande livro, e o que parecia irrepetível se repete sem se repetir, se me perdoa esse jargão que busca abrir caminho e se confunde um pouco.

Medina, droga. Que cara você é, Onetti. De qualquer forma, vou percorrer bastante o seu livro pelas ruas de Paris (espero que, algum dia, em Buenos Aires).

Um abraço,

 

Julio Cortázar
Paris, 12 de janeiro de 1980

*Cortázar refere-se ao romance Vamos deixar o vento falar, de Onetti .

 

À esquerda, Cortázar; direita, Onetti