*Alexsandro Alves
Em minha cama, ao meu lado, está Cory.
Cory é um gato de bom coração, de alma nobre e prestativo, um verdadeiro irmão. Nós aprendemos muito com os animais, ao ponto de darmos a eles características humanas. E Cory é um gato bom.
Eu o encontrei em agosto de 2013. Pequenininho, cerca de dois meses. Estava em apuros. Era noite e uma chuva fina caía em Santarém, zona norte de Natal. Eu voltava da escola e passava, quando ouvi seus miados, por baixo do viaduto. A chuva fina iria engrossar, era dessas chuvas que não nos enganam mais, começa suave, e termina em alagamento.
Eu não poderia deixá-lo.
O encontrei se arrastando. A cabecinha para o alto, miando em um misto de dor e confiança, implorava por ajuda. Era uma corpinho fraco numa alma forte, mas que não resistiria a uma tradicional noite de chuva natalense. Ele estava fraco, de fato. Sem se alimentar. E para que serve nossa fortaleza se ela for apenas nossa?
A força do mais forte deve ser a compaixão. E sendo assim, quando o encontrei, o protegi com as mãos. Era um filhote branco com preto e uma característica pinta preta embaixo do nariz, no lado esquerdo.
Assim que o peguei, pensei que ele pararia o miado, no entanto, miou mais alto à medida que me afastava.
Miou tão alto que parei.
E de repente veio a mim um pensamento: e se houver mais?
Retornei ao mesmo ponto em que o encontrei e liguei a lanterna do celular.
E lá estava ela. Uma gatinha preta com branco. A chuva caía em seu corpo estirado e imóvel, está morta, lamentei. Era bem mais magra do que o irmão. Não encontrei nenhum outro filhote.
Peguei o corpinho e o coloquei ao lado do irmão, na mão esquerda. Ele imediatamente parou de miar e deitou-se sobre ela. Assim, pequenininho, ele fez isso.
Quando cheguei em casa, dei leite para ele e deixei-o próximo da irmã.
Ao amanhecer, a primeira coisa que pensei foi enterrar a filhote. Mas não a encontrei!
E, para meu espanto e alegria ainda maior, ela estava viva em outro cômodo da casa. Não sei como. Queria ter ficado acordado para ter visto o momento em que aquele corpinho saiu da imobilidade e se animou.
A danadinha estava dentro de um prato cheio de ração, dormindo, e o irmão ao seu lado.
Receberam o nome de Cory e Bonnie.
***
Porém o destino gosta de jogar com disparidades.
Como disse, a alma de Cory é forte, inteira.
Mas ele teve problemas de saúde que ocasionaram amputações.
Por conta de constantes inflamações urinárias, o veterinário resolveu que seria melhor fazer uma penectomia. Faz tempo.
Agora, essa fortaleza felina passará por outra remoção.
Ele não consegue comer bem. Aos saltos, sai correndo quando inicia a mastigação de alimentos sólidos. Observando sua boca, há vermelhidão intensa na gengiva, tártaro e sangramento.
O levarei hoje ao veterinário, mas já estou preparado para, pelo que li na Internet, a extração completa de seus dentes.